domingo, dezembro 25, 2011

domingo, novembro 27, 2011

ORIOVALDO E A MOSCA BRANCA



    Na safra de algodão, Oriovaldo trabalhava duro! Acordava e logo  dependurava o saco de linhagem nas costas largas no qual colocava o algodão que colhia.
A plantação ocupava uma grande área da Fazenda Brilhante no interior de um pequeno município do Centro-Oeste.
Durante o dia o calor era intenso e seco e o vento, em certas horas do dia, era insuportável!
    Oriovaldo não tinha muitos problemas com a rudeza do clima. Nasceu e se criou entre plantações de soja e algodão, tanto que, no meio da tarde, soprava o vento que só trazia um inconveniente:  a poeira  vermelha e muito fina que penetrava narinas à dentro causando o único desconforto para ele.
Mas ocorria outro fenômeno: quando a terra seca baixava o vento trazia junto uma enorme nuvem de moscas brancas. Uma verdadeira praga! Pouco ou quase nada se podia fazer para evitá-las.
   Vez por outra Oriovaldo tinha que aplicar na lavoura um veneno muito forte e altamente tóxico que tinha a função de  matar as moscas pentelhas.
     Experiente no assunto, Oriovaldo, com 35 anos era num negro forte e, de tão preta que era a sua pele, chamavam-no pelo apelido de “Azulão”.
Ele já não se incomodava mais com este fato, porém sempre que tinha uma folguinha, ficava a pensar  como seria a vida para ele se branco ele fosse!
Ah! Aí estava o sonho do negro Azulão! Queria ser pelo menos por alguns instantes um sujeito de pele branca. Chegou a pensar que até sentiria menos calor por causa da nova cor.
Assim, Oriovaldo sonhava e sonhava... Na realidade era o trauma de Oriovaldo.
    Numa tarde muito quente, quando Oriovaldo estava em plena colheita ouviu o chamado de um catador que estava próximo. Prontamente o negro foi ao encontro do colega. Ao se aproximar viu que havia acontecido uma grande tragédia.
    - Acho que o moleque morreu; ele caiu de uma vez só, - disse o catador de algodão.
Ali estava o corpo entre flocos de algodão, poeira e moscas brancas que voavam de um lado para o outro e, de vez em quando, pousavam sobre o rosto do garoto desacordado.
Carregado até o posto de saúde ficou atestado pelos médicos que o moleque morrera do coração.
Mais uma tarefa para Oriovaldo: tratar do velório.
      O negrão fazia de tudo para agradar aos patrões. Realmente era muito prestativo.
Então, Oriovaldo varreu a sala, colocou os bancos para os parentes e amigos, trouxe uma bombona daquelas de plástico cheia de água e ficou esperando o corpo chegar do necrotério.
     Tudo ia muito bem durante o velório e Oriovaldo percebeu que poderia sair para fumar um cigarrinho e tomar um pouco de ar, já que as coisas estavam todas em seus devidos lugares.
Passou pela parentada do moleque, ouviu o choro e as lamúrias de algumas mulheres, pediu licença e foi até a cerca  perto de um pé de manga rosa-coração.
Foi quando um “pé-de-vento” soprou no rosto de Oriovaldo dando-lhe uma sensação de alívio. Na verdade ele não andava se sentindo muito bem. Desde a manhã daquele dia, depois que aplicou o veneno, que o negro estava um pouco tonto e com um mal-estar que ia e vinha.
      - Parece que comi muita pururuca com pinga, pensou Oriovaldo.
E, sentiu como que se o vento o tivesse arrancado da cerca e levado seu corpo para cima. Sentiu-se voando. Via tudo de cima; as pessoas chorando; outras conversando e tomando água por causa do calor e viu o caixão aberto e o menino repousando para a eternidade. Tudo parecia muito estranho para o negro.
Nesse instante Oriovaldo quis coçar o braço, mas notou que o seu lado direito parecia mais com uma peça de seda bem fina. Pareceu-lhe ser feito de um pano de algodão muito branco.
Oriovaldo assustou-se mais ainda quando viu a sua imagem refletida na cruz prateada que decorava o velório.
    - Sempre quis ser branco por uns instantes, mas não como uma mosca, gritou Oriovaldo horrorizado!
Ninguém ouviu seu grito. Ele tinha sido transformado numa mosca branca.
    O veneno tóxico inspirado pelo negro durante aquela manhã e a picada de uma das centenas de moscas que sobrevoavam o velório fez o Azulão virar uma mosca! Uma mosca branca!
    O velório seguia sua rotina. O cemitério ficava no fim da lavoura,  perto de uma árvore de ipê-roxo pelo lado sul da fazenda.
   Já cansados de procurar e esperar pelo negro Oriovaldo, que era muito amigo do finado moleque, e antes de colocar a tampa para fechar o caixão, os parentes  partiram para os atos finais de encomendação do defunto.
Feito de madeira de pinus o caixão mais parecia uma caixa de embalagem de frutas do que um caixão de finado.
   O ritual seguia sendo cumprido normalmente e Oriovaldo, agora transformado em mosca branca, pousou sobre o caixão. Quando se deu por conta a tampa estava sendo colocada e o negro, ou melhor, a mosca branca foi forçada a alçar-se num vôo suicida para dentro do caixão.
Oriovaldo tentou chamar a atenção das pessoas para si. Porém ninguém o ouviu. Ele gritou, bateu as asas finas, tentou voar enquanto a tampa começou a ser pregada! Ele entrou em desespero. A escuridão tomou conta do lugar. Oriovaldo procurou voar, mas sempre terminava batendo com a cabeça na madeira do caixão. O cheiro das margaridas que envolviam o corpo embrulhou seu o estômago. Por um momento quase vomitou, mas conseguiu conter-se até porque não queria lambuzar o finado.
Num instante, Oriovaldo percebeu que havia uma fresta entre a tampa e a parte de baixo onde repousava o defunto. Aproximou-se do pequeno orifício, espiou, novamente tentou gritar, bateu as asas freneticamente, mas ninguém percebeu sua angústia.
Oriovaldo tentava  raciocinar:
     - Nunca pensei em ser uma mosca branca; sempre quis ser um branco; jamais poderia imaginar que um dia eu ficaria preso dentro de um caixão de defunto e com o defunto junto! E mais:  daqui a um pouco eu serei enterrado com esse moleque.
    Depois de passar alguns minutos ouvindo e espiando o reverendo proferir as últimas palavras de enaltecimento ao féretro e distribuindo todas as bênçãos aos presentes, Oriovaldo sentiu-se cansado. Precisava descansar, repousar. Não tinha mais o mesmo vigor nas suas asas brancas; a voz do padre sumiu por completo dando fim as despedidas.
Procurou então um lugar mais confortável para poder recuperar as energias. Encostou-se e relaxou. Quando estava quase adormecendo, tomado pela exaustão, sentiu uma movimentação estranha.
     - Será que estão carregando o caixão? – pensou.
Mas a seguir conclui horrorizado que o caixão não havia sido deslocado.
    - Mas senão é o caixão então... E, soltou um berro de acordar até um defunto!
O moleque havia mexido a mão e justamente a mão onde Oriovaldo havia pousado.
Mais uma vez o negro tentou fugir e terminou batendo a cabeça na tampa. Meio tonto voou sem rumo e acabou pousando, forçadamente, no nariz do moleque.
- Aaaaaaatchimmmm!
Este foi o resultado da barbeiragem de Oriovaldo!
O pouso forçado provocou o espirro que foi ouvido num raio de quinze metros. A tampa do caixão foi arrancada em função do deslocamento do ar e saltou como um foguete; bateu no ventilador de teto e provocou a maior confusão na sala do velório.
Os convidados correram de um lado para o outro como se fossem moscas tontas. Vasos com flores e bancos foram derrubados; a bombona de água virou molhando o chão de cimento queimado; uma senhora de oitenta e oito anos escorregou e ficou com as pernas arriadas. Um velho, de noventa anos, viu a velha amiga que caíra, deixar a mostra as suas partes mais íntimas e lembrou-se de quantas vezes transitara por aqueles caminhos... Deu um suspiro e logo tentou sair do velório, mas antes bateu cabeça com o reverendo que se aproveitou da humilhante posição da carola para conferir se tudo ainda estava no lugar.
      A mosca branca, ou melhor, Oriovaldo havia aproveitado o momento do “lançamento de tampa de caixão” para voar o mais rápido possível para longe daquele lugar. Procurou a primeira janela aberta e  alçou vôo com destino à lavoura. Fez um sobrevôo de reconhecimento e notou que o moleque havia acordado.
Na realidade, ocorrera que a insolação e o cheiro forte do veneno provocaram um rebuliço na cabeça do menino. Cléberson não tinha morrido, então!
      Passaram-se duas semanas e Cléberson, o moleque, agora totalmente recuperado, sentou-se à mesa para o almoço com a família e seu mais novo amigo - a mosca branca!
Oriovaldo e Cléberson haviam ficado íntimos. Os laços dessa amizade foram selados por iniciativa de Cléberson que acompanhou compulsoriamente, ao vivo e pessoalmente, os acontecimentos dentro daquele caixão. Ele sabia da história de Oriovaldo, até mesmo pelo fato de que o moleque era o único que conseguia ouvir o negro Azulão gritar e falar. Assim, o negro acabou contando com detalhes a sua transformação.
   Oriovaldo passava o tempo todo ao lado de seu amigo com quem tinha momentos de muita alegria e felicidade. Os dois amigos davam-se tão bem que passavam horas relembrando o fato ocorrido no velório e dobravam-se em sonoras gargalhadas.
    Pois foi num desses momentos de total distração que aconteceu a outra tragédia!
A avó de Cléberson, a senhora que havia escorregado no velório,  recuperada do tombo no dia da “ressurreição” de seu neto, aproximou-se cuidadosamente e, com o chinelo na mão, desferiu um golpe certeiro naquela mosca branca que estava pousada no ombro do neto.
     - Essa nojenta já era, disse a anciã vitoriosa olhando para o inseto e empurrando-o para o chão com a ponta do chinelo.
     Cléberson olhou para Oriovaldo e não conseguiu acreditar no que havia acontecido.
Tentou reanimá-lo sem sucesso. Oriovaldo estava morto! A chinelada fora mortalmente definitiva.
   Num gesto carinhoso Cléberson colocou Oriovaldo dentro de uma caixa de fósforos pensando em fazer uma última homenagem ao amigo. A caixinha descansava sobre um guardanapo branco que estava em cima da mesa de jantar.
      Cléberson lembrou-se das conversas, risadas e dos passeios que faziam quando não havia muito vento.  Lembrou-se do espirro que seu amigo Oriovaldo havia lhe provocado no velório.
Lembrou-se da confusão e da correria das pessoas...
     Cléberson decidiu que não iria chorar. Enrolou a caixinha no guardanapo branco e decidiu que a levaria até a lavoura. Abriu uma pequena cova e enterrou seu amigo ficando com todas as tristezas entranhadas na sua mente. Não chorou! Naquela noite ele foi dormir tomado por uma enorme sensação de vazio. Demorou muito para que o sono chegasse. Dormiu na rede de renda branca que ficava sob uma mangueira no pátio da casa.
     O dia começou a nascer e Cléberson foi acordado por uns respingos que caiam no seu rosto entristecido. Aos poucos começou a abrir os olhos. Mais um respingo, e mais outro e outro...
Passou a língua pelo canto da boca e sentiu o sabor do suco de manga-coração. Percebeu que um pássaro azul, quase preto, estava bicando a fruta suculenta.
O  moleque acordou de vez, saltou da rede e falou baixinho fitando o pássaro nos olhos e que agora cantava e batia as asas longas: - Azulão, é você meu amigo!

O INSUPORTÁVEL FUTEBOL

Insuportável é o futebol...

sábado, outubro 15, 2011

DARCY ALVES - Chorinho & Samba

Eu tive o privilégio de assistir a apresentação de Darcy Alves na Feira do Livro de Novo Hamburgo. Ele é um mestre!!! 
Conheça a biografia do professor:


‎"O professor Darcy Alves, como é mais conhecido, iniciou-se na música aos 13 anos, em Santo Ângelo, sua terra natal, impulsionado pelo amor ao chorinho, a seresta e aos boleros. Começou tocando pandeiro, passando ao cavaquinho e violão, chegando a apresentar-se escondido, devido a pouca idade, em boates e clubes, integrando orquestras típicas. Após servir ao Exército, vem 'a capital gaúcha em busca de trabalho fora da área musical, mas não abandona o instrumento. Funda, junto com Zé Gomes, Ivaldo Roque e outros colegas o Clube do Violão, com o intuito de divulgar o instrumento. Tem participações como integrante da Orquestra Filarmônica Popular de Porto Alegre (OFIPPA), conduzida por Voltaire Dutra Paes (sobrinho de Otávio Dutra), de 1963 a 1972, na Waldemarino e sua Orquestra no período de 1963 a 1972 e na Orquestra Cassino de Santa Cruz, considerada na época, uma das melhores do Estado, de 1974 a 1978.

Na noite de Porto Alegre, tem participação e direção musical em bares famosos como o Adelaide´s Bar e o Chão de Estrelas, onde a nata musical e boêmia reunia-se na década de sessenta e setenta para tocar o que de melhor se produzia em música popular no Sul do País.

Acompanhou ao violão nomes como Lupicínio Rodrigues, Alcides Gonçalves, Beth Carvalho, Ângela Maria, Sílvio Caldas, Nelson Gonçalves, Altemar Dutra, Francisco Egídio e Jamelão, que o considera o violão preferido para acompanhá-lo. Durante cinco anos, tocou no Regional do Teatro São Pedro, acompanhando artistas como Altamiro Carrilho, Evandro do Bandolim, Déo Riam, Ademilde Fonseca e Carlos Poiares. Como compositor, o professor Darcy criou chorinhos, marchas, sambas-canções e valsas, tendo parcerias com o chargista Sampaulo e o senador José Paulo Bisol.

Décadas atuando com os melhores chorões, sambistas e artistas populares fez de Darcy um ferrenho defensor da música popular brasileira. "Infelizmente o mercado e a televisão negam um espaço que é legítimo ao artista que produz a música brasileira", afirma. O professor disse sentir nostalgia da época em que atuava em orquestras, e lamenta seu fim. "A qualidade apresentada por aqueles músicos e as oportunidades para apresentar um repertório da autêntica música brasileira desapareceram diante da crescente oferta de músicas banais executadas por todos os veículo de comunicação", explica.

O professor Darcy lançou em 1998 o CD "Um olhar para a musicalidade" (Funproarte), com obras de Darcy Alves, Lupicínio Rodrigues, Macedinho, Djalma Correa, e parcerias com Sampaulo e José Paulo Bisol. No CD, tocam Darcy Alves (violão 6 e 7 cordas, sax e voz), Valter de Oliveira (pandeiro), Silfarnei Alves (violão 6 cordas), Runi Correa (Surda), Francisco Pedroso (cavaquinho), e Maria Teresa Lima e Yedda Leite (vocais)."

Contatos: (51) 226-2839.

Perfil publicado na revista da Assovio (Associação Gaúcha do Violão), nº 7, março de 2001, página 11.

sexta-feira, outubro 14, 2011

BLUES DA ALMA LIMPA


BLUES DA ALMA LIMPA

SOU CAPAZ DE ENCONTRAR
O SOL, O CÉU E A EMOÇÃO
QUANDO TOCO NA GUITARRA
MESMO UM BLUES DE SOLIDÃO

UM ACORDE DE ALMA LIMPA
É COMO UM RAIO OU UM TROVÃO
RASGA A DOR E O DESALENTO
DETONA  A  DESILUSÃO

ATÉ OS MONSTROS DO TEU QUARTO
SE ENTREGAM NUM MOMENTO
COM MEU BLUES DE ALMA LIMPA
SE ACALMAM POR UM TEMPO

(Letra: George Arrienti e Urânio Laureano, musicando)

quarta-feira, setembro 28, 2011

BLUES na FEIRA DO LIVRO DE NOVO HAMBURGO


Está chegando a 29ª Feira do Livro de Novo Hamburgo
Falta pouco mais de uma semana para que inicie a 29ª Feira Regional do Livro de Novo Hamburgo. O evento, realizado pela Prefeitura, por meio da Secretaria de Cultura (SECULT), ocorrerá na Praça 20 de Setembro, no Centro da cidade, entre os dias 7 e 16 de outubro, e promete trazer grandes atrações além de uma grande variedade de livros. Segundo a secretária de Cultura, Anita de Oliveira, a feira é de extrema importância para a comunidade hamburguense. "A feira do livro é uma forma de incentivo à leitura, literatura e às letras. Nesse ano, a interação dessa expressão cultural será trabalhada em parceria com outras artes, como o cinema, o teatro, entre outros. O sabor da leitura também será apresentado em comparativo ao sabor e ao prazer do alimento. A leitura também pode ser saborosa e devorada", conta Anita.

Entre as atividades Pré-feira do Livro, aconteceu a escolha popular do patrono. Arno Kayser, agrônomo, ecologista e escritor hamburguense foi escolhido com mais de 60% dos votos.
(Fonte: site da Prefeitura de Novo Hamburgo)

sábado, setembro 17, 2011

JAZZUEIRA no 512 em Porto Alegre, RS - Brasil - 23/09/11

Saiba mais sobre o 512:
"Nossa história iniciou em 1999 com um grupo de escultores que
abriu seu ateliê na Rua João Alfredo, 512. Nesses mais de
10 anos, vários artistas passaram e deixaram sua arte por aqui.
Além de local de trabalho e criação artística, passamos a
incentivar e promover atividades culturais, educativas e sociais,
utilizando os ateliês também como local de oficinas de arte.
Em 2006 foi inaugurado o Espaço Cultural 512 que vem atuando
como ponto cultural com exposições artísticas, saraus literários,
shows acústicos, entre outras atividades."

http://espacocultural512.wordpress.com/

domingo, agosto 28, 2011

SARAMAGO


O reinado da audiência

Por Fundação José Saramago
Se o único que ofereces às pessoas é telelixo e impedes que existam outras coisas, elas acreditarão que não há mais nada para além do lixo. Nestes momentos, a audiência é a rainha e por ela é lícito até matar a tua avó. Os meios de comunicação têm grande parte da responsabilidade nisto, embora seja necessário perguntar quem mexe os cordelinhos. Por trás há empre um banco ou um governo. Um jornal independente? Uma rádio livre? Uma televisão objectiva? Isso não existe. Esta mistura, o telelixo e os media dependentes, provoca uma grave doença na sociedade.
El Diario Montañés, Santander, 11 de Julho de 2006
In José Saramago nas Suas Palavras

domingo, julho 17, 2011

FRAGMENTOS DE UM CONTO: "OS 7 CIBÓRIOS"



O ENCONTRO COM O CHEFE
- Bom dia, doutor Fritz. Sente-se e beba café; os biscoitos cobertos com canela em pó estão saborosos; prove-os, por favor!
- Bom dia, doutor Abzuk.
- Acordei sentindo a fome de um leão, doutor Fritz! Dormi muito bem e devo confessar tive um sonho maravilhoso.
Zander sentiu a musculatura do rosto se contrair e não teve coragem de olhar para o velho que prosseguiu narrando, – Ela era uma mulher maravilhosa e insaciável.
Descontrolado, Zander se levantou derrubando a própria cadeira.
- Não estou interessado nas suas orgias sexuais, Abzuk! Você me dá nojo! – Sem pedir licença foi saindo da sala pensando que poderia deixar o velho falando sozinho.
- Volte aqui, doutor Fritz, gritou Abzuk em pé e furioso pelo desacato.
Fez um rápido sinal para que o segurança impedisse a passagem de Zander.
- O senhor não irá a lugar algum. Temos muito para conversar, doutor Fritz.
Zander bem que tentou desvencilhar-se do brutamonte, porém recuou, voltando a sentar.
Josafá Abzuk acomodou-se na cadeira atrás da enorme mesa e colocou café na xícara de Zander.
- Tome o café, doutor Fritz e acalme-se. Sei que o senhor está estressado por conta da morte de seu irmão. Mas, é importante dizer o que o senhor terá que fazer. Quando o serviço estiver concluído eu darei uns dias de folga para que faça um longo passeio com a sua bela companheira, disse Abzuk sarcástico. - A propósito, se eu fosse o senhor eu levaria Dóris para Buenos Aires; é o lugar ideal para, digamos, aprofundar relacionamento com aquela admirável mulher.
Abzuk seguia provocando Zander chamando a atenção ao afirmar que os homens deveriam estar atentos e tratar de cuidar bem de suas mulheres. Dóris não resistiria ao menor assédio se não fosse bem atendida; - O senhor entende o que estou querendo dizer, não é mesmo? Então, podemos iniciar a conversa?
- Dispenso suas observações, doutor Abzuk. Fala logo!
Zander controlara-se. - O que o senhor quer de mim dessa vez?
- Bem, doutor Fritz. Estive pensando bastante sobre o laboratório e tudo que vem ocorrendo. Tive que tomar algumas decisões muito sérias para o bem dos meus negócios. O senhor sabe que sempre procuro ser o mais justo e ajudar àqueles que estão a minha volta. Aliás, o senhor, doutor Fritz, sabe muito bem do que estou falando.
- Vá direto ao assunto, por favor!
- O senhor continua tenso, doutor Fritz. Procure se acalmar.
- Fale o que o senhor tem para me dizer, doutor.
- Como eu estava descrevendo, tive que priorizar determinadas etapas. O senhor terá a incumbência de fazer com que o meu plano chegue ao final sem sofrer solução de continuidade. Nada poderá dar errado, o senhor compreende o que estou falando?
- Se o senhor falar, doutor Abzuk, certamente entenderei!
- Pois bem! Quero que o senhor acabe com a vida de Daniel!
(Zander permaneceu calado, atento, tenso e gélido!).
- Eu mandarei três de meus homens até o laboratório na madrugada de amanhã; eles encontrarão Daniel no escritório do hangar, pois o filho da puta fica até altas horas fazendo as contas de quanto está me roubando. Quando ele estiver desfalecido, por causa dos socos e pontapés, será levado até a sala de cirurgia. Lá o senhor estará aguardando a chegada do corpo desmaiado do paraguaio.
- Não conte comigo, Abzuk! Não para essa empreitada!
- Não quero sua opinião, doutor Fritz. Age da forma como eu estou mandando e tudo ficará bem para o seu lado.
Mais uma vez Zander estava sob ameaça.
- O senhor quer que eu corte Daniel em pedaços, doutor? Não é assim?
- Eu sabia que o senhor entenderia meu plano, doutor Fritz.  Mas, tem mais um pequeno detalhe. As partes dissecadas do paraguaio serão enviadas para destinos predeterminados, recheadas com cocaína, porém, a cabeça, eu quero que o senhor entregue, pessoalmente, ao seu querido amigo Glauco. Ele deve tomar conhecimento de que Daniel foi eliminado por me roubar.
- Nada mais poderá me surpreender, doutor Abzuk, em razão da maldade e frieza como toma decisões tão hediondas.
Nesse momento Abzuk levantou, foi até o armário e pegou um charuto. Acendeu-o calmamente, aproximou-se de Zander e, olhando fixamente para o médico, avisou: - ou você, doutor Fritz, cumpre minhas ordens, ou terei que mandar meu motorista buscar sua deliciosa ruivinha para passar algumas horas comigo, nem que seja, digamos, à força!

( Trecho extraído do conto: "OS 7 CIBÓRIOS". Autor: George Arrienti - 2009)



terça-feira, junho 14, 2011

AGRADECIMENTO ESPECIAL



Desde que inaugurei meu blog, em 2007, recebi visitas importantes de pessoas anônimas de alguns lugares do mundo que passaram os olhos pelos meus simples textos.
São pessoas importantes para mim que, de uma forma ou outra, circularam pelas minhas páginas editadas.
Os lugares são os seguintes:
Rússia, Itália, França, Luxemburgo, Bélgica, Sérvia, Angola, Noruega, Brasil, Estados Unidos, México, Indonésia, Índia, Arábia Saudita, Egito, Polônia, Malásia, Reino Unido, Turquia, Japão, Singapura, Nova Zelândia, Taiwan, Israel, Canadá, Belize, Porto Rico, Letônia, Brunei, Portugal, Argentina, Alemanha, Holanda, Grécia, Dinamarca, Venezuela, Lituânia, Austrália, Irã, Moçambique, Espanha e lugares pela Europa.
Muito obrigado a todos.

sexta-feira, junho 10, 2011

HUMANIDADE ANSIOSA


A evolução da humanidade se faz por conta da ansiedade. Tenho certeza disso.
Por isso, morremos enfartados. Não sabemos dimensionar nossas necessidades mais primárias.
Basta ver como nos comportamos.

Se vamos a uma recepção nos preocupamos com os cartões de visita e os colocamos estrategicamente no bolso do paletó para que tão logo sejamos apresentados ao outro, o aperto de mãos seja seguido de um cartonasso recíproco. Tudo muito mecânico e contábil.
Rimos e demonstramos segurança e afabilidade. Sorrimos e nos fazemos de velho amigo.
Logo partimos à caça e procuramos outro possível “negócio”.
Somos abordados e abordamos porque ninguém deve perder tempo; ninguém deve ser notado encostado num canto conversando sobre qualquer coisa que não seja “negócio”.
Assim é o padrão de comportamento se quisermos ser reconhecido e aceito na tribo.

Se vamos ao teatro queremos o melhor lugar e corremos a fim de chegar antes à bilheteria.

Se estivermos no trânsito temos que ultrapassar, pois estaremos em vantagem. Afinal chegaremos dez minutos antes.

Vamos ao restaurante e lutamos por aquela mesa na janela.

Nosso carro deve ser do ano. É preciso, porque o cliente fará sua avaliação de zero a dez ao observar o carro, a roupa, o corte de cabelo, o relógio, o modelo de nosso telefone celular, a marca da caneta.

Nós, com mais de 50, temos a impertinência de nos acharmos um pouco acima das coisas, pois os tropeços e vitórias nos avalizam. Sempre dizemos isso. Nossos cabelos brancos impõem certo respeito. Mas nos deixam incomodados porque parecemos velhos e isso poderá atrapalhar em algum momento.

Na verdade o comportamento humano, ao longo da história, demonstra uma enorme ansiedade que é provocada por regras impostas por padrões de comportamento da tribo em que vivemos e pelas oportunidades que vislumbramos.

Não conseguimos nos enxergar igual ao outro e nos exigimos ser superior, melhor e mais esperto.

Agora me dou conta.  Escrevi este texto porque me sentia ansioso e agora ficarei mais ansioso ainda aguardando por algum comentário no meu blog.

domingo, maio 22, 2011

SEMPRE UM BLUES

Com letra de LEILA SILVEIRA (http://leila-silveira.blogspot.com/) e música minha, "SEMPRE UM BLUES" nasceu na madrugada de 22/05/11.
(Link para o ouvir o áudio em: http://soundcloud.com/georgearrienti/sempre-um-blues-1




SEMPRE UM BLUES



SEMPRE UM BLUES  

NEGRO AVELUDADO RASGADO
SEMPRE UM BLUES
DESCENDO AS RUAS NAS MADRUGADAS
CHUTANDO UMA DOR PRO LADO
ESPANTANDO A SOLIDÃO

SEMPRE UM BLUES 
NUM BEIJO MOLHADO PAIXÃO
SEMPRE UM BLUES
TEU CORPO MORENO SEDUZ 
LAVANDO MINHA ALMA BLUES
SEMPRE UM BLUES

CHAMANDO UM ANJO
NEGRA DEVASSA INVERSA
É MELODIA DOS PORÕES DAS ALMAS
SEMPRE UM BLUES
MADRUGADA FRIA E O BLUES
O BLUES COMO COMPANHIA

sábado, abril 23, 2011

EXAGERO? LIVRO? AUTOR?

Não vivemos sem a televisão e eles sabem disso. Nosso ócio virou um grande negócio sem ética e respeito; cérebros são compulsoriamente transformados em grãos de lentilha, enquanto que hoje, sem nenhuma referência, as televisões "esqueceram" de divulgar ou dedicar alguns minutos nas programações ao DIA INTERNACIONAL DO LIVRO e do DIREITO de AUTOR.









sábado, abril 16, 2011

O SOBRADO

O sobrado de esquina nunca foi sua casa; ali não morou.
No quintal, árvores de cinqüenta anos e arbustos esquecidos, guardam histórias de família, de domingos, de crianças, de noites de verão, de brincadeiras, de tristezas e alegrias.
Sentiu-se como se fizesse parte daquela história.
Pensou nas paredes que já foram brancas e nas venezianas das janelas que talvez tivessem sido pintadas com verde.
Agora descoloridas pelo tempo rodam um filme em preto e branco, cinza, como o vazio que corrói seu peito.
Mas, por quê? Ali não foi sua casa; ali não morou.

quarta-feira, abril 06, 2011

POUPANÇA


A economia aquecida por conta do novo poder de gasto dado ao povo brasileiro, que não tinha como comprar quase nada - segundo alguns interessados na defesa dessa tese -, incentivou a gastança desmedida.
O dinheiro apareceu e proporcionou poder, poder de compra. E só!
Por trás, acontece que o dinheiro tão-somente circula; não pára; não cresce.
O dinheiro entra, o povo fica feliz, perde o senso crítico e, no outro dia, a moeda de ontem vai para a conta de grandes redes de lojas de móveis e eletrodomésticos, revendas de veículos zero, agências de turismo, companhias de aviação e volta para a conta de onde saiu, na forma de polpudos impostos que serão mal gerenciados, porque
assim deve ser a economia (?).
Mercado aquecido e o com o povo endividado, resta dar destino a última parte do dinheiro que ainda sobrou; o fim do dinheiro que ontem saciou "desejosos reprimidos do povo dantes esquecido e discriminado", agora dá a sensação superficial e inconsciente de estar enriquecido, pois alcançou degrau acima nas estatísticas de classes.
Quis dizer: a última parte do dinheiro é destinada aos bancos, pois os juros não podem esperar.
De modo particular eu desejo que o gasto incontrolado e o consumo desenfreado acabem logo.
Assim, seremos conduzidos a um choque cultural, de costumes e chamados à razão, quando então, o dinheiro será destinado à poupança, educação, saúde e segurança, empilhando pensamentos honestos e éticos que acabarão por sanear a vida do brasileiro e a cabeça de quem tem o poder de formar opinião.
Falta poupança no Brasil! Poupança cultural, moral e de costumes!

domingo, março 20, 2011

DEPRESSÃO



DEPRESSÃO

Quando tenho um bom romance é sempre assim, angustio-me com o fim.
Nada diferente agora que me aproximo da última página de uma das obras mais envolventes que já tive em mãos.
Falo de “HAVAÍ”, título traduzido do original norte-americano “HAWAII”, escrito por James A. Michener . O livro foi lançado no Brasil pela Record em 1983. Muito bem traduzido, aliás, aqui a única falha: esqueceram de dar crédito ao tradutor ou tradutora.
Nas quase mil páginas estão as mais belas imagens que já li!
É releitura! Já havia tido a experiência da leitura há tempo. Não resisti e saí em busca até que encontrei um volume num sebo, manhã de Domingo, no brique da Redenção.
Com o livro anterior eu cometi aquele erro fatal: emprestei e nunca mais foi devolvido.
É boa leitura garantida e, no meu caso, é “depressão de fim de livro”.

sábado, março 12, 2011

JERÔNIMO JARDIM

O escritor, compositor e músico Jerônimo Jardim prepara o lançamento da novela "SERAFIM DE SERAFIM".
No seu blog - http://jeronimojardim.zip.net/ - ele publicou o texto abaixo:

03/03/2011 
SERAFIM DE SERAFIM
Dentro de dois ou três meses publicarei em livro pela Editora Alcance a novela SERAFIM DE SERAFIM. Entendi oportuno postar, aqui no blogue, um texto sobre a novela escrito, a meu pedido, pelo também blogueiro e meu amigo GEORGE ARRIENTI.
 "Li “Serafim” quando Jerônimo publicou no seu blog em meados de 2007. Foram pequenas doses nem sempre diárias.
Agora, recebo do autor o original que será publicado em 2011. Que privilégio!
Falar das qualidades do texto, da novela que me envolveu, das idéias e conceitos que encontrei habilidosamente “soltos” nas entrelinhas, das vaias – experiência pessoal do Jerônimo – que ele conseguiu brilhantemente encaixar na narrativa, dos personagens tão reais como se eu os tivesse conhecido, é lugar-comum.
Porém, não posso deixar de destacar um aspecto que me agrada muito nos textos que leio e que estão presentes na novela “Serafim de Serafim”: Jerônimo não tem limites quanto à descrição dos detalhes das cenas e dos personagens; a riqueza é tanta que os cenários vão se formando e provocando o imaginário do leitor de maneira incomum.
Explorando muito bem o estilo real mágico, Jerônimo Jardim apresenta-se, mais uma vez, assim como já aconteceu em “In extremis”, como autor de textos envolventes e de muita qualidade." (GEORGE ARRIENTI).


http://blog.i.uol.com.br/mdl/4dot_s7.gif
 Escrito por Jerônimo Jardim às 15h23


domingo, março 06, 2011

RASGUEI MEUS BLUES


RASGUEI MEUS BLUES SEM PIEDADE
JÁ NÃO SINTO A MESMA PAIXÃO
TENHO FALTA DE CUMPLICIDADE
OS ACORDES SÃO FALSOS, ENTÃO
A HISTÓRIA FICOU MAL CONTADA
SEM LETRA, SEM RIMA E SEM CHÃO

RASGUEI MEUS BLUES SEM PIEDADE
APAGUEI AS LETRAS, ENFIM
JOGUEI DISCOS E FOTOS NO LIXO
ILUSÕES DE UM TOLO APRENDIZ
VOU FECHAR A PORTA DO TEMPO
MAS, O BLUES FICA DENTRO DE MIM

George Arrienti   
Link para ouvir o áudio: http://soundcloud.com/georgearrienti/rasguei-meus-blues-em-arkansas/s-tmhre 

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

CÍNICO E CANALHA

      CÍNICO E CANALHA
Sou um velho cínico e canalha
Daqueles que não se pode confiar
De dia sou sério e generoso
De noite sou um bêbado bluesman
Nunca me entregue seu coração
Porque sou capaz de detonar


Sou um velho cínico e canalha
Daqueles que não se pode confiar
Mas tenho o coração amplificado
E um puta blues pra te mostrar
Depois que escrevi este blues, enfim
O sol decidiu brilhar pra mim


(Link áudio: http://snd.sc/g7cxR0)



segunda-feira, janeiro 24, 2011

FRAGMENTOS DE UM CONTO...


A história que conto agora aconteceu em 1954 numa vila localizada no interior de um município do Rio Grande do Sul, no Brasil meridional.
A vila foi fundada por volta de 1.890 por imigrantes alemães. As casas e instalações foram construídas num vale cercado de montanhas. Um rio margeava a cidade de ruas poeirentas, porém muito arborizadas. A vila não tinha mais do que 1.500 habitantes.

O ABORTO

                   Karl Zander tinha um consultório muito bem montado localizado próximo ao Hospital Geral do distrito de um município próspero.
O lugar era bastante industrializado e tinha a economia baseada no setor coureiro.
O gado da região era criado com a finalidade de fornecer o couro que, depois de curtido, abastecia as fábricas de calçados. Quase todos os moradores trabalhavam nas fábricas.
                   As clientes do Dr. Karl eram as mulheres grávidas. Em 1954, Zander criou um sistema inovador que firmava um convênio com as fábricas, o qual, dava aos funcionários – homens e mulheres -, perante um pagamento mínimo do valor da consulta, a condição de serem atendidos até o nascimento do bebê.
                   O doutor Zander gozava de excelente conceito entre seus pacientes. Ele era o único médico na região.
                   Pois, foi durante um procedimento médico que o doutor Karl Zander precisou tomar uma decisão rápida que lhe trouxe muita dor de cabeça.
                   Numa noite, já em casa após um exaustivo dia de consultas e cirurgias no hospital, bateram à porta de sua casa. Zander ouviu a voz de um homem que o chamava desesperadamente.
                   - Doutor, por favor! Venha ver minha filha! Ela está mal, muito mal!
                   - Acalme-se, homem. Onde ela está?
                   - Venha comigo. Vamos até minha casa em Lautertberg.
No caminho ele contou que a filha completara 14 anos e ficara grávida de um rapaz, guarda-livros na vila vizinha. Se conheceram há seis meses durante uma festa, namoraram e ela teria sido seduzida pelo jovem que, aliás, desapareçera depois de tomar conhecimento da gravidez da namorada.
Após contar com detalhes o relacionamento dos dois jovens, o pai, muito nervoso se apresentou.
                   - Desculpa. Sou Lothar Lenner. Tenho um empório na Linha 17, do outro lado de Lautertberg.
                   Depois de uma hora de viagem por uma estrada de terra, em cima de um pequeno caminhão, chegaram à casa de Lothar. Logo os cães se aproximaram e latiram em volta dos dois homens.
Ouvia-se o barulho do gerador próximo ao galpão que não se conseguia enxergar devido à noite. Fazia frio e a chuva fina caía.
                     Subiram os degraus da escada de madeira que dava acesso à varanda e Zander foi convidado a entrar.
                    - Esta é minha mulher Helga, doutor; sirva qualquer coisa quente para o doutor, mulher, - e dirigiram-se para o quarto onde estava a filha de Lothar.
Ao lado da menina, sentada na cama, uma mulher tratava de molhar o pano na bacia com água morna e de pronto colocava sobre a testa da jovem. A bacia, em cima do criado-mudo, era abastecida de água que Helga trazia em uma chaleira de ferro.
Lothar pediu que a mulher se afastasse para que o doutor pudesse examinar a adolescente.
Zander observou que o estado da menina era muito grave. Fez os primeiros exames e pediu para ficar a sós com a jovem. Por cerca de cinco minutos ele examinou com cuidado aquela pequena.  Em seguida pediu para ficar a sós com Lothar.
                     - Sua filha está muito debilitada. Ela está correndo risco de morte. Tenho que levá-la para o hospital e, bem, tenho que fazer o aborto. É a única salvação.
                     - Doutor, saiba que eu não fui buscá-lo para ouvir falar em aborto. Sou totalmente contra. O senhor encontre outra solução e que seja rápida e eficiente. É a vida dela que está em suas mãos e que nada de pior aconteça com ela. Eu não sei como  reagiria num caso extremo, doutor Zander.
                      - Lothar, o médico aqui sou eu e o único que pode saber o que fazer. Portanto, se você quiser a sua filha viva, autorize esse procedimento, por favor!
Depois de pensar por alguns segundos, Lothar olhou para Zander e dissse:
                      - Está bem. Mas, se minha filha morrer..., - e saiu do quarto batendo as botas no chão de madeira.
                      Lothar, Zander, Helga e a menina chegaram ao hospital depois de quase uma hora de viagem.
Já na sala de cirurgia, a jovem foi submetida aos procedimentos médicos. A intervenção demorou quarenta minutos.
Os pais, apreensivos, haviam convocado um pastor para lhes dar apoio espiritual naquele momento tão difícil pelo qual estavam passando.
                     Zander saiu da sala de cirurgia com a pior notícia. A garota havia morrido tinha pouco mais de dez minutos.
Lothar não se controlou e partiu para cima de Zander desferindo-lhe um potente chute. Zander caiu, batendo  a cabeça na parede. Lothar seguiu desfechando socos e tapas e, aos berros na sala de espera do bloco cirúrgico, gritava : - Assassino! Assassino! Você matou minha filha!


terça-feira, janeiro 04, 2011

A CARTA


PARIS, ANOS DEPOIS. (Carta a Roberto)

         Caro amigo Roberto,
         Aqui estou eu debruçado sobre a minha prancheta, às cinco horas da manhã. Faz calor e o verão parisiense é indigesto e sem graça; gostaria de estar em Copacabana bebendo chope gelado e olhando para o mar, mas como sempre falei, a vida está sempre nos colocando à prova. Sinto saudade do Brasil; estar exilado, mesmo em Paris, é desumano.
        Não tenho amigos por aqui e juro que, sem eles, eu sou ninguém. Por isso o meu tempo eu gasto no trabalho, em desenhos e leitura; tenho ouvido muita música.
Ganhei de brasileiros que chegaram do Rio, e passeiam pelo Velho Mundo, dois LPs  com o melhor da bossa nova. Muito bom!
        Meu escritório fica na Champs Elysée; aqui da janela eu já posso ver o francês se movimentar para o trabalho, escolas e escritórios; porém eles são muito diferentes de nós brasileiros; andam olhando para eles mesmos!
       Terminei, nesse momento, o croqui da Sede do Partido Comunista Francês; está muito bonito; acho que irão aprovar. Quero que você crie algo para os jardins. Vou mandar as plantas com os desenhos e fotografias do local.
       Lamentavelmente Candim se foi (e já tem cinco anos!); se estivesse vivo, eu daria para ele uma parede enorme que certamente viraria um belo mural!
       Responda minha carta, por favor!
       Paris, outubro...
      Assinado: Oscar

       Recado à hiena da censura: se você abrir essa carta antes que ela chegue às mãos de meu amigo, saiba que eu acho você um grande merda!