sexta-feira, outubro 17, 2008

AS NOVAS ADMINISTRAÇÕES

Fico aqui pensando como serão as novas administrações municipais após as eleições.
Acompanhei, embora que distante e sem muita motivação, debates e propagandas políticas; estas, então, ridículas tanto pela obrigatoriedade do cedimento de espaços na mídia como pela falta de conteúdo e qualidade de alguns – quase todos - candidatos despreparados e demagogos.
Com a classe política desmoralizada por conta de repetidos casos de corrupção e deslizes éticos, candidatos se esforçaram – e ainda se esforçam - tentando convencer eleitores prometendo coisas impossíveis. E, mesmo sabendo da falta de dinheiro que irão enfrentar, seguem insistentes por baixo de camisas suadas e mangas arregaçadas.
Eleitores um pouco mais atentos conseguem perceber nos sorrisos e afagos a falsidade e o interesse sub-reptício; para os candidatos somos um mundo de possibilidades; somos um rebanho acuado que, por causa do medo manipulado, da segurança esquecida, da pobreza histórica e da miséria de muitos estamos na mira do mais astuto e persuasivo.
O eleitor crê! Espera, acredita e aposta. Os que estão mais próximos do candidato sentem-se resolvidos, arrumados e orgulhosos; mais ou menos como uma-mão-lava-a-outra.
Seria como quem crê no paraíso; compra um cantinho no céu laborando por diárias, refeições e camisetas. De positivo é o trabalho farto e disponível para quem quer em épocas de eleições. Tudo bem! Depois cessará e a realidade baterá à porta.
E é neste comportamento de troca de interesses frágeis - na verdade angustiantes para ambos os lados - que me apego.
Assim é a política, assim somos nós - os eleitores - e assim são os políticos.
Não vejo como os novos administradores cumprirão promessas.
A única certeza que tenho é a falta de verdadeiros líderes políticos corajosos e desprendidos de interesses pessoais independentemente de siglas e ideologias.

terça-feira, outubro 07, 2008

NOVO HAMBURGO - PORTO ALEGRE - NOVO HAMBURGO - BR116


Quem se aventurar por esta superada via deverá estar preparado como se fosse subir num ringue de vale-tudo.
Por questões de trabalho tenho que me submeter às regras impostas por motoristas raivosos, vingativos, atrasados e que usam o celular enquanto pilotam veículos de passeio, caminhões, ônibus, kombis e até motocicletas, como eu mesmo já presenciei.
A inexistência de sinalização adequada só perde em quantidade - e qualidade - para a falta de fiscalização, totalmente inexistente, por parte do polícia rodoviária federal.

Placas orientando motoristas de caminhões para que circulem na pista da direita foram recentemente instaladas ao longo do trecho, mas parece que os caminhoneiros não aprovaram, porque permanecem circulando pela esquerda demonstrando falta de educação. Eles não cumprem as leis básicas de trânsito e desafiam autoridades que preferem enfiar a cabeça no buraco e deixar por isso mesmo.

Que a rodovia está superada, não há dúvida.
Porém, ações inteligentes no sentido de organizar o trânsito – eu disse: inteligentes – estão longe de acontecer. Afinal, pensar, para alguns técnicos – deve doer!

A BR116 é um caso de pesquisa científica.
Ali transitamos nós, brasileiros, que não gostamos de leis, porque temos que cumpri-las; de impostos, porque temos que pagá-los e não nos dão retorno social, político e individual.
De polícia, porque não é eficiente; de caminhões em excesso transitando em alta velocidade quando produtos e serviços deveriam ser distribuídos e prestados de formas mais adequadas e diligentes.
Nós, brasileiros, aceitamos regras impostas pela impunidade, tanto que elegemos políticos corruptos que olham para o próprio umbigo e, quando têm alguma qualidade, são engolidos pelos interesses maiores – eu disse maiores? – da confraria político-partidária.

Pelo menos hoje eu consegui voltar para casa somente com o prejuízo moral, pois contrariando as regras eu tentei – que me desculpem os motoristas das carretas – manter a velocidade máxima de 80 km.
Coitadinha da minha mãe!
Pois é! Agora me dou conta!
Lembrei-me de uma notícia na internet sobre um engenheiro português que, para se defender da multa que levaria ao ser parado numa rodovia por excesso de velocidade, argumentou com o policial dizendo que a placa não informava se era por hora, metro, segundo, ou por dia!
E nós nos achando espertos dentro de nossos carrinhos!

quinta-feira, outubro 02, 2008

A PRIVACIDADE JÁ ERA...

Li na internet que os japinhas estão desenvolvendo celular que permitirá ver através das paredes.
Pois, na verdade, a tecnologia que invadirá nossas vidas, de certa forma, já é uma realidade.
Um amigo contou que estava na suíte máster de um motel transando com sua mulher e pensou estar tendo seu desempenho sexual avaliado através de um pequeno aparelho instalado junto ao teto, que ele viu, no momento de uma das peripécias.
Trepando, mas numa das cadeiras do quarto, ele arrancou aquilo constatando ser uma microcâmera. Indignado, ele invadiu a sala da administração e encheu a atendente com os piores impropérios, além de derrubar a bandeja com as xícaras e a garrafa térmica que se se espatifou no chão, manchando o carpete cor caramelo que cobria a sala. A câmera de segurança testemunhou tudo!
Depois da confusão, ao sair, ainda ofendeu o porteiro do motel fazendo aquele característico sinal com o dedo médio, tudo sob a mira da câmera do circuito interno e externo de segurança daquele estabelecimento.
Dois dias após ele foi à delegacia de polícia, pois fora intimado por um escrivão a prestar esclarecimentos por conta da balbúrdia e a desordem provocada no motel.
Depois das formalidades o delegado informou que o depoimento estava sendo filmado e que serviria como prova, caso meu amigo fosse levado ao juiz.
Sorte foi que seu advogado conseguiu gravar as imagens dentro da sala do delegado. Enquanto ocorria a sessão de perguntas e respostas o advogado habilidoso disfarçou que conversava ao telefone celular, quando na verdade filmava tudo.
Ninguém sabe como, mas as imagens da chegada do meu amigo àquela delegacia foram parar na televisão. ( É que ele é um cara conhecido; joga futebol num grande clube e assim temeu perder os polpudos reais que recebe pelo direito de imagem que o patrocinador detém. Ele desconfia que esteja sendo seguido por algum paparazzo.)
A diferença com relação à notícia que li na internet é que os japinhas possibilitarão a invasão total de nossa privacidade. Seremos vistos no quarto, na cozinha, pelados, vestidos e em outras situações mais indiscretas ainda.
E, vice-versa, cada um de nós poderá bisbilhotar através das paredes...
Sinal dos tempos!

sábado, setembro 27, 2008

Sugestão Política



I - DAS OBRIGAÇÕES DOS POLÍTICOS ELEITOS - DEMISSÃO

Art. 1º - o candidato eleito deverá realizar todas as promessas feitas durante a campanha conforme os compromissos assumidos publicamente e de acordo com o cronograma por ele apresentado.
$ 1º - Vencida a data da realização da promessa qualquer cidadão poderá requerer a demissão imediata do safado.

sábado, agosto 02, 2008

ENFADADO

Não é a falta de assunto que me atormenta.
É o exagero de informações que são jogadas para comprar a audiência e vender espaços.
Mortes, corrupção, crianças assassinadas, seqüestros, estupros e agora políticos que prometem o paraíso...
Zangadiço e rabugento me vejo diante de tanta notícia repetida, repetida e igual...
Não há critério; não há qualidade; não há ética; não há limites...

É um bostal!

sábado, julho 05, 2008

BEBER PODE!

A grande confusão causada por causa da “lei seca” está deixando muita gente descontente.
Na minha desimportante opinião acho que o limite definido como “zero” não foi bem avaliado; talvez até meio-burro!
Porém, a lei diz aquilo que já dizia antes; a alteração foi o limite que diminuiu e, ao mesmo tempo, as abordagens que aumentaram.
Então, beber pode; não pode dirigir se beber.

Quando a lei que proibiu o fumo em lugares fechados foi editada as reclamações surgiram de todos os lados. Pois o número de fumantes não diminui; o câncer de pulmão também não e hoje convivemos pacificamente com quem fuma e carrega seus problemas respiratórios.
Assim, o número de pessoas que bebem da mesma forma não irá diminuir. Teremos que nos adequar à nova situação usando motoristas, taxis, amigos que não bebem ao volante, etc.
É uma questão de educação e de saber qual o próprio limite.

Penso que está acontecendo certo exagero em tudo isso.

Logo, logo, a lei deverá sofrer correções.
No caso do limite zero este certamente será aumentado e, depois que as empresas que fabricam e vendem o temido bafômetro enriquecerem, depois que a fiscalização voltar ao padrão que todos nós conhecemos e a mídia se dedicar a CPI-DO-PRÓXIMO-ESCÂNDALO - deixando de lado os crimes de estupro e seqüestros, entre outros - tudo voltará à normalidade brazuca.

Ocorre que os marginais soltos pelas ruas aterrorizam os que bebem ao dirigir, os que bebem sem dirigir, os que não bebem, não fumam e que quase não podem mais sair de casa.

Os marginais não são abordados e continuam soltos; os que bebem um copo de cerveja são submetidos às abordagens policiais e presos.

Ou será que depois dessa lei todos somos criminosos?

quarta-feira, maio 21, 2008

Teatro Paschoal Carlos Magno

O Teatro Municipal de Novo Hamburgo tem o nome de Paschoal Carlos Magno.

No dia 01/08 a Banda BBLUES estará realizando o Show BBLUES-LEME-BLUES que será em prol da LEME - Lesados Medulares de Novo Hamburgo.

A seguir apresentamos a biografia de Paschoal Carlos Magno, figura importante da história do teatro no Brasil.

Biografia
Paschoal Carlos Magno (Rio de Janeiro RJ 1906 - idem 1980). Animador, produtor, crítico, autor e diretor. Personalidade fundamental na dinamização e renovação da cena brasileira, Paschoal Carlos Magno funda o Teatro do Estudante do Brasil e o Teatro Duse.
Em 1926, faz uma experiência como galã em Abat-Jour, de Renato Viana. Em 1928, tem uma fugaz participação, como ator, no Teatro de Brinquedo, de Álvaro Moreyra; e escreve críticas para O Jornal. Em 1929, lidera ampla campanha de coleta de recursos para fundar a Casa do Estudante do Brasil. Em 1930, recebe da Academia Brasileira de Letras, ABL, um prêmio pela sua peça Pierrot, montada no Rio de Janeiro pela companhia de Jaime Costa, da qual Paschoal assume a direção artística. Em 1937, funda o Teatro do Estudante do Brasil, TEB, inspirado nos teatros universitários europeus, com uma função pedagógica, de formação teatral, e outra artística, de introduzir no nosso teatro a função do diretor teatral, cargo para o qual convoca a atriz Itália Fausta, que assina o primeiro espetáculo do grupo, Romeu e Julieta, de William Shakespeare, em 1938.
Em 1946, Paschoal tem representada em Londres, com boas críticas, a sua peça Tomorow Will Be Different, montada em vários outros países europeus, e também no Brasil. No mesmo ano, assume a coluna de crítica do jornal Democracia e, no ano seguinte, a do Correio da Manhã, que assina até 1961, através da qual exerce forte influência sobre o panorama teatral. Em 1948, sob sua orientação geral, e com direção do alemão Hoffmann Harnisch, o TEB monta Hamlet, de William Shakespeare, que alcança enorme sucesso e prestígio, sobretudo por revelar, no papel-título, o singular talento do jovem Sergio Cardoso, então com 22 anos, a quem Paschoal define, na sua coluna, como sendo desde já o maior ator do Brasil. Sob a repercussão desse êxito, e das viagens de Paschoal pelo Brasil afora, teatros de estudantes começam a ser criados em várias cidades. Em 1949, Paschoal preside o lançamento pelo TEB, de um Festival Shakespeare, no Rio de Janeiro, com Romeu e Julieta, Macbeth e Sonho de Uma Noite de Verão; e cria, junto com a cantora Alda Pereira Pinto, o Teatro Experimental de Ópera.
Em 1952, Paschoal leva o TEB para extensa turnê pelo norte, com peças de Sófocles, Eurípides, William Shakespeare, Gil Vicente, Henrik Ibsen, Martins Pena. No mesmo ano, dá início a uma outra iniciativa importante: o Teatro Duse, uma sala de aproximadamente 100 lugares e um palco mínimo, instalada no casarão de Paschoal, em Santa Tereza. Inaugurado em 1952, com João Sem Terra, de Hermilo Borba Filho, o Duse funciona, com ingresso gratuito, até 1956, revelando, entre outros, Aristóteles Soares, Francisco Pereira da Silva, Leo Vitor, Antônio Callado, Rachel de Queiroz, Paulo Moreira da Fonseca, Maria Inês Barros de Almeida, e conquistando um lugar de prestígio no panorama cultural do Rio de Janeiro. Nomeado responsável pelo setor cultural e universitário da Presidência da República por Juscelino Kubitschek, desloca-se permanentemente pelo país afora, garimpando jovens talentos e lutando pela criação ou dinamização de espaços onde eles possam dar vazão à sua ânsia de aprender e criar. Em 1958, organiza em Recife o primeiro Festival Nacional de Teatros de Estudantes, reunindo mais de 800 jovens e dando início a uma tradição que prosseguirá até o sexto festival.
Nomeado, em 1962, secretário geral do Conselho Nacional de Cultura, realiza a Caravana da Cultura, reunindo 256 jovens artistas que percorrem os Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Sergipe e Alagoas, apresentando espetáculos de teatro, dança e música e realizando exposições de artes plásticas e distribuição de livros e discos. Uma iniciativa semelhante, a Barca de Cultura, que desce pelo Rio São Francisco de Pirapora a Juazeiro, é promovida por Paschoal já na década de 70. O golpe de 1964 o afasta dos centros do poder e prejudica a sua carreira diplomática. Sua última grande realização inicia-se em 1965, quando ele inaugura, no interior do Estado do Rio de Janeiro, a Aldeia de Arcozelo, da qual pretende fazer um local de repouso para artistas e intelectuais e um centro de treinamento para as diferentes áreas das artes. Mas a volumosa obra consome o resto da sua fortuna e o obriga a vender o seu casarão de Santa Tereza para pagar as dívidas. Ainda assim, o dinheiro revela-se insuficiente, e Paschoal ameaça publicamente tocar fogo na fazenda. Alguns auxílios, oficiais ou privados, chegam a ser liberados; mas até hoje a Aldeia de Arcozelo encontra-se fechada sob o domínio da Fundação Nacional de Artes Cênicas.
O crítico Yan Michalski avalia sua contribuição ao teatro brasileiro: "Paschoal Carlos Magno, pessoa física, foi na verdade uma instituição: sozinho, embora sempre ajudado por legiões de jovens que ele sabia contagiar com a mística das suas utopias, ele quase chegou a exercer, às vezes, funções que caberiam a um informal Ministério da Cultura. Personalidade polêmica, era muito questionado por repetir infinitamente um ritual que consistia em inventar e lançar um projeto de sonho aparentemente utópico, e, a seguir, mover céus e terra para cobrar dos poderes públicos os recursos necessários para a sua concretização; e também por atribuir triunfalmente - sobretudo na sua coluna do Correio da Manhã - vislumbres de genialidade a promessas, sobretudo regionais, que ainda davam seus primeiros passos. Muitas das inovações que trouxe à vida teatral brasileira foram genuinamente revolucionárias; mas havia na sua atuação um toque paternalista claramente conservador. Não há dúvida, porém, de que seu apostolado defendia, quase sempre, as boas causas; de que o seu entusiasmo revelou talentos que sem o seu apoio dificilmente teriam desabrochado; e de que raras são, ainda hoje, iniciativas válidas do teatro brasileiro a que não esteja ligado alguém que não tenha recebido em algum momento um empurrão decisivo do patriarca de Santa Tereza".1

Texto extraído do site ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL

sábado, maio 03, 2008

QUEM DISSE?

Hoje à tarde nos reunimos para um encontro musical, como fazemos aos sábados, aqui no estúdio caseiro que, tempos atrás, foi um quiosque.
Nando (20), meu filho, fez percussão; cajon, bongô, tamborim, rebolo, pandeiro, etc; Guilherme (19), na guitarra Ephifone, solou e acompanhou e eu, o tiozão (54), fiz vocal e guitarra acústica, numa Condor na medida. Tudo rolou num volume adequado aos ouvidos, apesar de os instrumentos estarem “plugados” nos combos Fender e Meteoro, típicos do rock, blues e até coisa mais pesada.
Tocamos MPB e Bossa Nova; no repertório tinha Carlos Lyra e Vinícius, Tom Jobim e Newton Mendonça, Menescal, Lúcio Alves e Haroldo Barbosa, Tito Madi e outros.
A idéia foi do Nando; assim conversei com o Guilherme – também conhecido como “Cabelo” – por causa da longa madeixa; ele topou na hora!
Foi uma tarde daquelas que não esquecerei, pois além de tocar música de qualidade e brasileira, passei pela experiência de ver os garotos interessados numa fase musical na qual eu vivi como adolescente.
Lembrei das “rodas de samba” na sala de estar da casa de meus pais e que aconteciam aos sábados à noite.
Muito samba, bossa nova, músicas de protesto contra o regime, músicas de fossa, festivais no Auditório Araújo Viana, rodas de violão nos intervalos das aulas no Julinho, rodas de samba na Arquitetura, na PUC...
Hoje todo esse filme passou por trás dos meus olhos... Foi gratificante ver os garotos envolvidos com a boa música.
Quem disse que a garotada está alheia errou feio, pois nem tudo está perdido!

sábado, abril 19, 2008

CAMBURIU DOS VELHOS DE MARÇO

Nas tendas montadas à beira-mar, nos bancos espalhados pela calçada ao longo da orla e à sombra de árvores eu encontrei hoje, dezenas de idosos quando estive no Balneário Camburiu.
Brasileiro-gaúchos e argentinos, que identifiquei pelas enormes cuias ou pelas “cuiazinhas” pequenas típicas do “mate” dos “hermanos”, eles se acomodavam na areia de Camburiu; jogavam bocha, malha, dominó e conversa fora.
A idade daquela turma eu estimei acima dos sessenta; alguns perto dos oitenta e até mais.
Vi muita disposição, fato que me fez deduzir que aqueles velhos tinham plano de saúde e boas aposentadorias, ao contrário da maioria da população de idosos que, pelo menos no Brasil, morrem e mofam nas filas da previdência social com os bolsos vazios; ás vezes, com uns trocos para a passagem de volta para casa a fim de voltarem dali a dois ou três meses porque não havia mais ficha no posto.

Nas muitas cafeterias do calçadão, que ficam bem no centro, numa daquelas características ruazinhas transversais à Beira-Mar, mais velhinhos de março ocupavam as mesas bebendo café e conversando sobre futebol e doenças, temas preferidos dos idosos.

Nada de guardas vestidos de azul; nada de policiamento ostensivo; nada de flanelinhas e pedintes e nenhum, mas nenhum banheiro químico!
Como se “aliviam” depois de tanto mate, chimarrão e prováveis diuréticos por causa da pressão alta?
Fiquei sem resposta, mas acho que, pela proximidade da praia, os velhinhos se deslocam até os hotéis.

Nada de lixo acumulado!

E os carros? Estes param antes das faixas de segurança! Esperam pacientemente a lenta travessia dos velhinhos!
Será o tempo de Camburiu medido em uma escala que não conhecemos ou a educação dos motoristas foi despertada?
Será a passagem das horas para os velhinhos de Camburiu diferente da velocidade do resto do Planeta?

A Camburiu dos velhos de março não é o Brasil dos brasileiros e certamente não é a Argentina dos argentinos, mas um sonho de março.

segunda-feira, abril 07, 2008

OS PRAZERES...

Apesar de me sentir muito bem fazendo arquitetura de residências e edifícios, é não menos prazeroso poder sentar à varanda da casa de praia e ler bons livros.

Na minha bagagem eu coloquei dois livros: Psicanálise e Arte - A Busca do Latente, de Myrna Cicely Couto Giron e Histórias Dentro da História, de Sergio Faraco.
Tão importantes como os chinelos, bermudas e camisetas os dois volumes me seduzem durante períodos alternados de dias ora ensolarados, ora chuvosos.

Solitário, mas nem tanto, curto o prazer da leitura de histórias que falam sobre o alferes Tiradentes, o patrono. O militar, contraditoriamente, odiava seus companheiros de caserna; mesmo assim foi escolhido representante pelos próprios militares.
Leio também sobre as interpretações da Psicanálise que, mesmo não sendo uma ciência, tenta explicar com fatos as razões que formam o artista, quer seja um músico, escritor, pintor ou aqueles que se expressam esculpindo estátuas.

Falando em prazeres interrompo este texto, pois a cerveja já está gelada e os camarões prontos.

Até mais.

(Texto escrito durante as férias)

domingo, abril 06, 2008

BBB e o DOSSIÊ

O Brasil vai além da boa criatividade na forma que conhecemos. Somos únicos! Leonardo da Vinci teria inveja!
Acabou o BBB da Globo!; - para aqueles que investiram horas (que me desculpem pela opinião) no lazer televisivo mais improdutivo dos últimos anos, um novo reality show surge nas telas dos brasileiros.
Falo dos dossiês dos gastos do ex-presidente Fernando Henrique versus a rasgação da grana do governo do nosso presidente Lula que, aliás, atingiu os melhores e maiores índices de aceitação, segundo as últimas pesquisas.

A propósito: eu não fui entrevistado e também não conheço ninguém que tenha sido abordado por qualquer um dos órgãos de pesquisa.

O amadorismo da companheirada é de dar dó; - se bem que nem tanto se analisarmos o recente episódio da extinção da CPMF que acabou aumentando os impostos, mas que agora está sem controle da população, pois estão espalhados e diluídos por aí em vários impostos filhotes...

A ministra Dilma gaguejou tanto na entrevista dada ao Jornal Nacional que a explicação mereceria ser explicada, se é que tem explicação.

Horas e horas serão dedicadas à matéria; dengue, segurança, saúde, CPI's, educação, desvalorização do real e outros probleminhas tipicamente brasileiros ficarão para depois até que, novamente, dê em nada!

terça-feira, abril 01, 2008

BRASIL, BRASIL..

Depois de quase nove horas - deveriam ser sete horas - viajando por uma rodovia entupida de veículos finalmente cheguei ao destino. Saí de Novo Hamburgo rumo à Canto Grande, em Santa Catarina.
A BR 101 é indescritível! Fica evidente a falta de planejamento do governo federal que permitiu, irresponsavelmente, que o caos se instalasse.
Excesso de veículos - principalmente de caminhões - nos dá uma amostragem clara do resultado negativo da política absurda adotada há anos que escolheu as rodovias como a forma de distribuição de alimentos e de todo o tipo de mercadoria.
Pelo menos não vi nenhum acidente, se bem que alguns motoristas imprudentes fizessem o maior esforço para que alguém acabasse morrendo entre ferragens contorcidas, prova de que as campanhas contra os acidentes de trânsito não estão atingindo os objetivos desejados.

As estradas estão sucateadas e por elas transitam veículos cujos proprietários pagam impostos; o dinheiro é mal aplicado e desviado de seus objetivos e tudo com o endosso dos governos.

Quando a BR 101 for concluída certamente que já estará ultrapassada porque teremos mais veículos rodando e as políticas de distribuição de produtos ainda estarão defasadas continuando a priorizar o transporte através de caminhões.

Na verdade o poder de dependência imposto pela indústria de veículos pesados, pneus, peças, etc., é tão forte que não conseguiremos nos desfazer da subordinação instaurada.

Assim acontece nas cidades, pois o transporte coletivo de qualidade é deixado de lado pelas autoridades e pelos usuários fazendo a indústria automobilística cada vez mais presente jogando um número enorme de carros nas ruas subdmensionadas para um trânsito alucinante.

O canteiro de obras instalado ao longo da BR 101 também é detentor de outras péssimas referências que aparecem na desordem e na falta de sinalização adequada. As placas informando desvios e os perigos existentes são poucas ou não existem trazendo tensão ao motorista menos atento e experiente.

Desta forma seguimos atropelando a história desperdiçando oportunidades políticas e sociais sem falar no gasto irresponsável do dinheiro público.

domingo, março 30, 2008

ABORDAGEM POLICIAL

Circula por aí uma cartilha idealizada pelo governo federal que orienta o cidadão brasileiro como proceder na hora de ser abordado por um policial.
Assim como já aconteceu no caso de procedimentos nos assaltos a cartilha, brilhantemente, diz que o assaltado ou o abordado não deve ficar nervoso e procurar acalmar-se.
Mas como um cidadão de bem pode permanecer calmo se diante de seus olhos está um bandido a apontar-lhe uma pistola?
No caso de abordagem policial o tamanho do susto poderá ser maior ainda porque o “treinado” policial está por trás e sabemos que está portando uma espingarda e, sabe-se lá, apontando para o céu ou para o chão.

domingo, fevereiro 17, 2008

CONTRADIÇÕES

O Brasil “é fértil em contradições, povo e território” assim como escreveu Jerônimo Jardim no seu blog http://jeronimojardim.zip.net/.

É tão fértil e contraditório que proibiu a venda de bebidas alcoólicas pelos proprietários de estabelecimentos comercias, querendo punir motoristas irresponsáveis. Pois os proprietários fecharam as portas que se abriam para as rodovias federais e abriram outras que dão acessos pelos fundos ou pelos lados. Os pinguços agradeceram e festejam bebendo à esperteza.
Falta educação para quem vende aos que bebem ao dirigir e para os legisladores, da mesma maneira.

Por que não fazemos de forma exemplar? Se o cara for pego dirigindo embriagado retira-se a carteira de motorista e o “bebum” nunca mais poderá dirigir, além de pagar vultosa multa. Que o cara vá para a cadeia sem possibilidade de fiança.
Falta uma lei rigorosa que puna de uma única vez sem dar chance ao infrator.

As campanhas que circulam na televisão não podem ser de pior qualidade, pois mais destacam artistas globais do que transmitem a verdadeira mensagem cujo objetivo seria educar o povo.
De tão ruins acabam instigando o bebedor contumaz, fazendo com que ele beba uns goles a mais a fim de provar que, mesmo embriagado, ele não é daqueles que fica “grudado na traseira dos outros”; afinal de contas seria a melhor forma de provar para aqueles belos rostos da propaganda que bebida e direção mais um punhado de violência fariam dele “o macho, o garanhão”.

A contradição é tão grande que, enquanto as campanhas circulam, alguns clubes de futebol, escolas de samba, vinhetas de rádio que oferecem bebidas a “um real” a noite toda, seguem sendo patrocinados pelos poderosos fabricantes de cervejas.
Por que o governo - sempre ávido por impostos – não aumenta o preço da bebida alcoólica? Resolveria dois problemas: primeiro diminuiriam as despesas com internações em hospitais e pensões por invalidez ou mortes; no segundo problema - que é do interesse palaciano – sobraria mais dinheiro para pagar as mordomias dos seus funcionários (claro que sem espumantes e uísques importados).

segunda-feira, fevereiro 04, 2008

SELEÇÃO INATURAL

É quase impossível querer justificar os crimes que estamos acompanhando, somente pela ótica do abandono social, descuido das autoridades, desprezo, preconceito, ausência de trabalho, educação, etc.

Um homem raptou e estuprou uma criança de três anos; o professor de Educação Física matou três mulheres porque fazia “racha” e bateu no carro conduzido por uma mãe, causando seqüelas psicológicas nos familiares; o bandido matou o dono de um armazém que reagiu porque estava sendo roubado; o maior ladrão de bancos fugiu da prisão sem a menor dificuldade.

Assisti um programa na televisão que mostrava bandidos assassinos de alta periculosidade nas cadeias seguras, limpas e não superlotadas do poderoso Estado norte americano fazendo-me ver que, mesmo vivendo em um país rico e que dá todas as condições de trabalho e renda, o ser humano opta pelo crime.
Lá tem escolas, programas sociais, saúde, emprego e punição exemplar, mas nada disso impede a delinqüência de alguns indivíduos.

A floresta é desmantelada e pouco se faz para impedir a ação criminosa de pessoas com a menor consciência e respeito pelo próximo; as leis no Brasil não são cumpridas, mas menosprezadas como fez o dono de um restaurante ao afirmar que continuaria vendendo bebidas alcoólicas já que ninguém respeita e não seria ele aquele “idiota” que iria retirar as cervejas do freezer.

Aliás, a lei que proíbe a venda de bebidas nos estabelecimentos à beira de rodovias federais seguirá pelo caminho de tantas outras que inicialmente impactam, mas em seguida caem no esquecimento pela falta de educação do povo – que continuará bebendo mais ainda - e por conta da falta de fiscalização, exercida por uma polícia treinada para cuidar das rodovias.
As liminares já começaram a “pipocar” por todos os lados, sinal que já começou a “fazer água”.

Então, o homem que estuprou a criança de três anos, o professor e o ladrão de armazém, se não forem retirados do convívio social e punidos rigorosamente, seguirão cometendo crimes afrontando àqueles cidadãos de bem.
A impunidade é a arma dos delinqüentes contra a população assustada e indefesa.

Se a causa do comportamento desequilibrado e desumano é resultado de traumas ocorridos dentro das famílias ou por falta de programas educativos, então que os políticos trabalhem para isso e a sociedade exija resultados e aja em favor daqueles menos preparados.

O grande problema é que a criminalidade e a bandidagem superaram todas as expectativas. Como as leis são frágeis e não punem corretamente alimentam mais ainda àqueles fragilizados que escolhem roubar em vez de trabalhar por um salário carregado de impostos que mal dá para a alimentação de uma pequena família.

quarta-feira, janeiro 30, 2008

COM AS QUATRO PATAS


Fui a um cartório de registro de imóveis a fim de demonstrar que uma das exigências solicitadas pela titular na revisão da documentação que eu protocolara, além de não estar de acordo com as normas técnicas, também fora interpretada por ela de maneira equivocada e que, na análise elaborada, a titular utilizara critérios diferentes para a mesma situação.
A “titular”, como ela fez questão de salientar ao se dirigir a mim grosseiramente, não aceitou meus argumentos e sugeriu que, se eu não concordasse que eu fosse procurar o juiz. Virando-se e saindo, deixou-me no balcão de atendimento sem maiores explicações.
Depois fiquei sabendo através de outros profissionais que o comportamento da “titular” é sempre repleto de indelicadezas, aliás, comportamento costumeiro em outros cartórios.
O clima dentro da sala de trabalho ficou tenso por conta da voz alterada daquela senhora.
Havia um cheiro de burocracia no local - e no estado sólido, eu poderia afirmar!
As máquinas de escrever e os toques nos teclados dos computadores subitamente pararam e enormes livros com capa dura serviram como escudo para aqueles funcionários envergonhados – mais uma vez provavelmente naquele dia – por causa do comportamento daquela senhora com fixador nos cabelos, brincos enormes, batom vermelho e muito – mas demasiadamente mal-humorada.
Claro fica que a arrogância da senhora é totalmente incompatível com o cargo e a função que ela desempenha. Aliás, educação é obrigação de quem lida com o público.

Aprendi, por aí, que a ofensa só é completa se o ofendido aceitar a provocação. Não acolhi a afronta.
Por fim, fiz como todos fazem ao encaminhar processos naquele cartório, ou seja, tudo de acordo com a solicitação da titular, embora sabendo que ela estava errada.
Por que agi assim?
É porque, na próxima oportunidade, serei punido com retaliações e meus processos serão esquecidos em baixo de uma pilha de pastas; sei que se eu recorrer ao judiciário, o assunto ficará em baixo de outra pilha de processos e ainda correrei o risco de perder – não a ação movida, talvez – mas o meu cliente; enfim sei que os superprotegidos “titulares” de cartório não serão punidos. Eles não serão demitidos ou exonerados (sei eu qual o termo correto) por mau atendimento, arrogância, indelicadezas ou erros técnicos de avaliação.
E eles, os “titulares”, também sabem disso, por isso a prepotência se mostra tão evidente.

Por esta falta de iniciativa de enfrentar a situação é que a “titular” seguirá atendendo com as quatro patas.
É como o velho ditado: “manda quem pode e obedece quem precisa”.
Enquanto não reagirmos, a coisa permanecerá como já acontecia no tempo do império.

sexta-feira, janeiro 25, 2008

MADURO, MAS NEM TANTO.

Joaquim Assis, 72 anos, Cineasta, Engenheiro e Músico-Regente Coral fez, durante entrevista concedida ao Canal Brasil, uma frase curiosa ao responder a seguinte pergunta feita pela repórter:
- O senhor se considera maduro aos 72 anos?
A resposta rápida acompanhada de um sorriso maroto foi a seguinte:
- Não, porque “maduro” está muito próximo do “podre”.

sexta-feira, janeiro 18, 2008

ESTRANHAS SENSAÇÕES

Dois acontecimentos que vivi nos últimos dias me fizeram sentir estranhas sensações que acredito transformarão conceitos ou preconceitos que tenho.
Melhor dizendo, verei certas coisas de forma diferente. Pode alguém pensar que é asneira ou exagero meu.
Explico.
O primeiro fato se refere ao analfabeto, àquele que não sabe ler as letras expressas, por exemplo, na placa que informa o destino do ônibus.
Senti-me como um analfabeto ao abrir a página de uma revista especializada em musica quando não consegui ler a partitura para iniciantes que explicava como executar uma simples canção.
Antes de tudo senti um tipo de raiva contra mim mesmo. Fiz enorme esforço. Tentei por raciocínio lógico, por comparações visuais entre aquelas bolinhas pretas ligadas por linhas e que pulavam de um lugar para o outro, subiam depois desciam, se ligavam e eu sem entender nada.
Depois senti vergonha por não saber ler aquilo. Mais adiante senti um vazio sem explicação...
Lembrei das aulas de “orfeão” ministradas pela Dona Neli, a professora do primário. Ela me ensinou algumas coisas sobre partitura. Eu sabia escrever uma clave de sol... Mas não passou disso. Esqueci e permaneci analfabeto.
A sensação de desconforto aumentou mais ainda quando pensei naquelas pessoas que assinam com o polegar lambuzado de tinta. É humilhante!

O segundo acontecimento ocorreu ainda hoje pela manhã.
Atropelei um cachorro – e dos graúdos – quando eu trafegava pela BR 116. O cão apareceu do nada. Freei, porém não deu tempo para desviar. O bichinho bateu no pára-lama do meu carro, rodopiou e, desnorteado, ficou por alguns segundos arrastando-se na pista. Os olhos do animal fixaram-se nos meus que, a esta altura, estavam mais arregalados que os olhos verdes do cachorro com pelagem castanha e lisa.
A troca de olhares estabeleceu um vínculo de afeto. Pareceu-me que ele pedia explicações e eu, perguntava se estava tudo bem. Estranha sensação. Um ser humano e um animal vivendo experiências tão intensas.
A seguir o bichinho se levantou e saiu correndo para a calçada.
Eu acelerei o carro e segui em frente, afinal estava eu numa rodovia e não poderia ficar ali parado sob pena de ser abalroado por outro veículo. Esta é a desculpa para a fuga!
Não prestei socorro e este fato me incomoda até agora. Estará em boas condições aquele cão? Teria ele quebrado uma perna ou costela? Hemorragia interna talvez? Estará morto na calçada? Ou pior: agonizando? E o afeto? Esqueci?

Duas sensações estranhas que ficarão comigo até que o tempo me ajude a entender melhor a vida.

Conto: VILA FORMOSA


- Este é meu avô – disse o jovem segurando a velha tela pintada a óleo.
Com o próprio lenço de algodão branco o rapaz retirou a grossa camada de pó que descansava sobre a moldura quase toda tomada pelos cupins.
Algumas caixas cheias de papéis com anotações manuscritas, cadernos com capa dura e folhas amareladas, livros e recortes de jornais com manchetes políticas ocupavam o chão de madeira daquele quarto.
Raios do sol da tarde penetravam pela janela com gelosias confeccionadas por algum marceneiro habilidoso e de confiança do guarda-livros, o homem retratado naquele óleo e que mandara construir aquela casa de veraneio em 1904.
No piso superior do velho sobrado com vinte e três cômodos ficavam os quartos, banheiros e a sala de leitura e estar. A escada de madeira, com balaústres torneados, chegava ao longo e largo corredor para o qual as portas dos cômodos se abriam.
A pintura descascada nas grossas paredes de tijolos de barro mostrava as várias cores das tintas que foram sobrepostas durante os anos em que o sobrado foi habitado pela família. O cheiro de mofo pairava no ar.
No quarto ao lado, um pouco menor que aquele anterior, havia somente uma cama de solteiro com um grande mosqueteiro pendurado no teto por pequenos ganchos, o criado-mudo e uma cadeira de balanço. Sobre a mesinha de cabeceira a bacia de louça branca e a jarra pareciam ter sido esquecidas naquela posição; o colchão de molas protegido por tecido listrado tinha manchas amareladas e marrons. Do teto pendia o lustre com quatro braços que resistira até agora a iminente queda somente pelos fios de luz.
Melancólico o rapaz explicou que naquele quarto sua avó passara os últimos dias de vida até que morreu vitimada por doença respiratória.
- Foram dias muito tristes - disse o jovem.
Um arrepio correu pela pele do corretor de imóveis que acompanhava o herdeiro do sobrado.
Depois, os dois vistoriaram os banheiros que eram equipados com banheiras e sistema de aquecimento de água para o banho através de caldeiras a lenha. Abriram portas e janelas e vasculharam dormitórios e salas.
No final do corredor, ao abrirem uma porta, uma pequena escada dava acesso ao sótão. Pelo menos há vinte e cinco anos o sótão não recebia visita de qualquer pessoa.
A cada passo o estralejar das madeiras do piso provocava um ar de mistério, agora testemunhado pelos visitantes. O rangir das portas e das janelas que eles abriam toda vez que entravam naquelas dependências despertava a curiosidade e a vontade de descobrir segredos ocultos.
Em outra sala o armário da biblioteca deixava à mostra os poucos volumes que resistiram às traças e aos cupins. A grande porta de madeira e vidro, ao lado da entrada, dava acesso à sacada, elemento principal da fachada do casarão com características neoclássicas.
Quantas conversas e silêncios; quantos beijos e abraços; quantas histórias acontecidas e guardadas pelo tempo.

Enquanto o herdeiro descrevia particularidades sobre o sobrado, fatos que lhe foram relatados pelo avô, o corretor fotografava com cuidado cada canto do sobrado.
O material fotográfico seria parte integrante do relatório de venda do imóvel e que seria entregue a uma grande empresa do setor da construção civil. O plano era a edificação de uma torre residencial.

Depois de uma hora e de terem circulado pelas dependências do térreo, entre pisos de mármore, cristaleiras embutidas e a ampla cozinha com as paredes revestidas com azulejos bisotados, os dois visitantes chegaram à área externa.
Nos jardins que envolviam o sobrado, árvores frondosas definiam espaços de estar e o que deveria ter sido o estacionamento de carros. Nos fundo do lote ainda havia a piscina e quiosque com churrasqueira e uma construção de pedras de granito.
A propriedade era protegida por muros tão altos que seria impossível o acesso externo senão por escadas.
A casa não estava de toda abandonada. A pouca manutenção do sobrado e dos jardins se dava pela mínima disposição do caseiro que morava nos fundos do sobrado.
Ele era um homem idoso e fora o motorista da família até os últimos dias de ocupação do velho casarão. O negro era forte e afirmava que impediria, enquanto tivesse forças, a derrubada do sobrado da Vila Formosa que ele ajudará a construir.
Sempre que podia afirmava que, se a demolição viesse a acontecer, dias de muita tristeza e fatos estranhos poderiam ocorrer.
O fato é que quase ninguém levava a sério as ameaças daquele preto-velho.


A HISTÓRIA CONTA

A casa que fora construída para servir como opção de descanso foi adotada pela família como moradia definitiva. Assim, Dona Formosa – a esposa do guarda-livros – instalou, de um lado, um armazém de secos e molhados, e do outro, a primeira loja de fazendas e armarinhos da cidade.
Provavelmente tenha sido um período de muito trabalho e com bons lucros, pois a casa recebeu obras de ampliação em 1923.
A residência permaneceu habitada por um dos filhos até 1999.


VOZES NO CASARÃO

Antes de concluir o relatório que seria levado ao mercado imobiliário, o corretor ainda necessitaria voltar ao casarão a fim de obter os últimos dados. Na impossibilidade de ser acompanhado pelo anfitrião e herdeiro que viajara para São Paulo, o corretor, tendo as chaves do sobrado, retornaria à velha casa.
O dia era de inverno e chuvoso. Como escurecia cedo a inspeção não poderia se estender até muito tarde e, por volta das dezesseis horas, ele se dirigiu ao local.
Constatou que o caseiro não se encontrava, apesar de verificar que portas e janelas do pequeno quarto-e-sala do único habitante daquele local permaneciam entreabertas.
Depois de chamar pelo homem duas ou três vezes e não obtendo resposta, o corretor foi até a porta que dava acesso à cozinha, pelos fundos do casarão, a fim de fazer o levantamento final. A porta não estava chaveada. Naturalmente, como se estivesse pedindo licença e sem saber bem o motivo, ele bateu antes de entrar.
Abriu devagar a porta e, assim que adentrou, ouviu vozes de pessoas.
Novamente pediu licença. Sem resposta. Caminhou até a próxima porta que dava acesso à sala de jantar. Não viu ninguém. As pessoas continuavam confabulando. Ele ouviu o som do que seria o tilintar de louças, talvez xícaras e pires. A conversa era discreta, porém animada. Deu mais dois passos à frente. Voltou a pedir licença.
Subitamente a conversação cessou e o silêncio tomou conta. Segundos depois percebeu o barulho dos saltos de sapatos a bater no piso de mármore. Ele acelerou a passada. Chamou por alguém. Ouviu que agora subiam as escadas rapidamente.
Sentiu a própria respiração acelerada. Assustado com aquela surpresa e antes de chegar à escada, recuou até a cristaleira, à entrada da sala de jantar. Procurou o interruptor a fim de acender alguma lâmpada. Acionou-o e logo o ambiente foi tomado pela luz do único lustre da sala. Sentiu alívio. Consultou o relógio.
Na agenda do celular encontrou o número do telefone do jovem que o acompanhara dias atrás durante a primeira visita. Teclou nervoso. Não obteve resposta. Tentou o número de um colega de escritório. Sem sucesso.
Guardou o celular no bolso da calça e pensou que deveria seguir em frente, afinal, amanhã, ele tinha reunião com os empresários, prováveis investidores, e as informações que ele necessitava tinham que ser obtidas.
Tudo quieto. Ele decidiu que iria seguir em frente.
Cuidadosamente chegou até o início da escada iniciando a subida. Já atingira a metade quando o celular tocou. Desajeitado enfiou a mão no bolso da calça e, quase sem tirar os olhos do corredor superior, olhou para o visor do telefone que piscava. Cores se alternavam num pisca-pisca que logo se apagou.
O corretor lembrou que deveria trocar aquele celular, pois desde que ele deixara o aparelho cair dias atrás, quando esteve na casa com o jovem herdeiro, o problema se repetira várias vezes. Parte da agenda de contatos desaparecera do aparelho e as chamadas, como aquela que recém acontecera, vinham se repetindo.


A BIBLIOTECA

Agora ele estava no corredor do segundo piso e se dirigia para a biblioteca. A madeira do piso estalava contrariando o desejo do corretor porque aquele barulho irritante, por mínimo que fosse, anunciava sua presença. Porém, tentou se acalmar. Afinal somente ele estava no velho casarão, apesar de ele mesmo ter dúvida.
Na biblioteca ele deveria tirar fotos que iriam para o catálogo de informações. Quando escolhia o melhor ângulo viu numa das prateleiras alguns livros que lhe chamaram atenção.
Abriu o que restara da cortina para que a pouca claridade da rua entrasse pela porta cujos vidros estavam opacos por conta da poeira que se fixara. Pegou o exemplar com cuidado. Não conseguia identificar o título. Abriu-o constatando, atônito, tratar-se de um raro volume da Bíblia. Na próxima página amarelada leu que era um incomum exemplar impresso por Gutenberg e a data indicava 1445.

O corretor tinha opinião firmada quando o assunto era religião. Não acreditava
em nada que não pudesse ser provado através da ciência e não aceitava o
comportamento daqueles que não contestavam e deixavam a razão de lado para
acreditarem em dogmas e adorarem estátuas de gesso. Os ignorantes se
submetiam àqueles padres e pastores que se diziam os únicos capazes de abrir as
portas para o paraíso.
Para ele religião era coisa de gente inculta, frágil e insegura.
Ao mesmo tempo ele detestava a falsidade e a imoralidade dos padres.

O livro sagrado - como dizem os crentes - era uma obra muito importante e ele achou melhor esquecer o ódio que o dominava. Mas como poderia se apropriar de uma coisa que não lhe pertencia? O herdeiro deveria saber da existência daquele livro.
Porém, o cara que fosse à merda, pensou. Ele já tinha o bastante!
O corretor colocou o volume na pasta que carregaria com cuidado extremo.
A Bíblia de Gutenberg valeria um bom dinheiro em qualquer antiquário.
Posicionava-se para retomar o melhor ângulo para a foto; quando dava um passo atrás foi surpreendido pela voz do caseiro que, furioso, dizia que era proibido tirar fotos do casarão.
O corretor, ao perceber que era o negro caseiro, sentiu alívio e raiva ao mesmo tempo.
Com os braços abaixados segurava a máquina digital na mão direita.
Apontou o dedo na direção do rosto do caseiro dizendo: - tu não sabes de nada, homem! Como tu podes me dar ordens? Tu és só o caseiro. Agora saia e me deixe seguir com o meu trabalho.
O negro permanecia quieto e frio.
Porém, o corretor ainda tinha que saber sobre as vozes. Não poderia dispensar o velho e recuou dizendo: - Está bem, caseiro. Estou nervoso porque ouvi vozes lá em baixo e barulho de gente subindo as escadas. Procurei mas não encontrei ninguém. O que tu sabes sobre isso?
- Guarda tua máquina, corretor; e vá embora deste casarão.

Aquele negro estava indo longe demais, pensou o corretor que faria mais uma tentativa, afinal, ele se considerava superior e persuasivo.
- Noto que tu não queres colaborar. Pois fique sabendo que eu estou tratando de um negócio milionário. Ganharei muito dinheiro com a venda deste sobrado de merda.
Aqui nesse local será construído o melhor edifício residencial da cidade. Ah! – exclamou o corretor dando as costas e gesticulando – tu nem sabes o que é morar num apartamento, ainda mais com mil metros quadrados e mais, logo tu terás que procurar um chalezinho lá no fim do Guajuviras – falou em tom de deboche.
- Eu vi o senhor colocar a Bíblia do meu patrão dentro da pasta, corretor!
- E daí? – perguntou o corretor virando-se novamente.
- Ela vale muito dinheiro, corretor. Meu patrão me falou. E é da família.
- Teu patrão tá cagando pra essas coisas, caseiro. Ele não precisa de uma Bíblia. Aliás, ninguém precisa de uma bosta destas. Só os trouxas acreditam nesse monte de histórias inventadas por alguns gananciosos e mentirosos.
- Então devolva o livro, já que o senhor acha que não serve pra nada, senão...
- Senão o que, caseiro? – perguntou o corretor.
- Faças do jeito que quiseres, mas estou lhe avisando. Esqueça que este sobrado existe. Procura outro terreno. Aqui não é um bom lugar.

A tarde caia e quase já não havia mais luz natural. O corretor não suportava mais ter que discutir com aquele homem. Não conseguira concluir o levantamento e tão pouco saber sobre as vozes.
Talvez este último fato o incomodasse mais que a presença do negro, pois lhe trazia de volta um velho problema. A sua terapeuta alertara-o sobre a possibilidade de acontecerem momentos de incertezas.
Seriam aquelas vozes conseqüência da sua provável esquizofrenia? – pensou ele. Como não se considerasse um doente, abandonou aquela lembrança.

Sem dizer uma palavra o corretor guardou a máquina digital na pasta saindo da biblioteca em direção ao corredor para de lá descer a escada. Na metade da escada falou em voz alta para que o caseiro ouvisse: - cada macaco no seu galho – depois riu desconcertado, cruzando a grande sala até que deixasse o sobrado.
Já na calçada, logo que bateu o portão de ferro trabalhado por algum serralheiro artesão, o corretor olhou para a janela da biblioteca que se abria para a fachada para confirmar sua suspeita de que o caseiro lá se encontraria. Mesmo estando com a janela fechada o negro caseiro notou que o homem gritava, acenava e ria repetindo a frase: - cada macaco no seu galho.


O HERDEIRO

- Bom dia. Aqui fala o corretor que está encaminhando o negócio do sobrado Vila Formosa. Quero falar com o jovem felizardo proprietário daquela maravilhosa casa.
Pode passar a ligação – disse ele, de forma arrogante, à telefonista, que obedeceu.
- Olá. Bom dia. Como estão os contatos? – perguntou o herdeiro.
- Bem! Muito bem! Hoje tenho reunião marcada para tratar da visita ao sobrado. Diga ao caseiro que limpe o terreno e retire o lixo. Não será interessante que os empresários encontrem o local do jeito que está.
- Tu estiveste ontem lá no sobrado, pelo que fui informado.
- Vejo que o negro já se meteu novamente. Aliás, ele se comporta com se fosse o dono do sobrado. Eu tive que...- antes que continuasse opinando o corretor foi interrompido pelo herdeiro.
- O caseiro é homem de minha confiança. É idoso e merece todo o meu carinho e respeito.
- Por favor, homem! O negro é um metido! Eu não consegui terminar o levantamento dos dados que eu necessitava por causa dele. Seguiu-me o tempo todo pelo sobrado!
- Eu sei. Ele me falou – disse o rapaz de forma reticente.
- O velho é um pentelho. No dia da visita ao sobrado não quero vê-lo por lá. Ele poderá atrapalhar e dizer coisas que não nos interessa. O velho que vá pra casa de algum parente.
- Ele não tem parente algum. Eu conversarei com ele. Faz o teu trabalho que eu tratarei do assunto. Mais alguma coisa?
- Está bem! Não vou perder meu tempo falando de um preto-velho – disse o corretor jocosamente.
- Até logo – falou o herdeiro irritado encerrando o diálogo e desligando.


O CORRETOR

A enorme Figueira cravada no meio da alameda fora preservada. Não fossem as exigências legais a árvore já teria sido derrubada em nome do desenvolvimento e do progresso.
No apartamento duplex, no andar de número 18 do prédio construído no terreno onde estava a figueira, era onde o corretor vivia.
Morava só. A auxiliar de limpeza fazia duas visitas por semana e não tinha muito trabalho, pois o corretor era exageradamente cuidadoso. Exigia que nada fosse retirado dos lugares; os talheres, louças e apetrechos de cozinha deveriam ser desinfetados com álcool nos dias de faxina. Toalhas de banho e roupas de cama deveriam ser trocadas semanalmente.
Em nenhuma hipótese ele permitia que as janelas fossem abertas; excepcionalmente para limpeza, mas logo deveriam ser fechadas, inclusive as cortinas.
Não havia tapetes porque, segundo o corretor, causava alergia, além de acumular pó.
No mezanino estava a suíte onde ele também utilizava como sala de home-cinema.
Na parede em frente à cama, sobre o balcão cuidadosamente projetado estava a televisão com tela plana.
O quarto era o refúgio para aquele homem que já não pensava em relacionamentos que lhe trouxessem compromissos. Às vezes convidava garotas de programa para noites de sexo. Ele não trocava uma palavra se quer com as mulheres e, antes de tudo começar, exigia que a garota não se expressasse de forma alguma, nem por fingimento.
Quando estava com uma garota ele satisfazia seu próprio desejo sem se importar com a parceira.
Antes mandava que ela se despisse enquanto ele a observava deitado na cama masturbando-se; depois a garota deveria se entregar de forma submissa obedecendo às ordens por ele emitidas; o sexo acontecia sempre da mesma maneira e não ia além de toques e sexo oral que ele exigia que a companheira praticasse somente nele.
Ele não as tocava nem com as mãos nem com a boca. Mantinha distância e detestava perfumes e cheiro de cigarro.
Logo que a garota terminava seu trabalho ele indicava o caminho do lavabo que ficava no pavimento inferior, próximo ao hall de entrada do estúdio, para que ela lavasse a boca e as mãos, se quisesse. As toalhas usadas no lavabo pelas garotas de programa eram colocadas em um saco de lixo plástico e jogadas fora pela faxineira nos dias de limpeza. O lavabo deveria ser desinfetado com álcool.
A roupa de cama ele retirava substituindo-a por um jogo de lençóis e fronhas limpas.
Tendo cumprido parte do ritual de sexo por ele traçado o corretor tomava demorados banhos de imersão na banheira SPA da suíte quando se masturbava intensamente imaginando estar trepando com a garota que saíra há pouco.
Mais tarde, sentindo-se relaxado, ele então assistiria aos telejornais e depois aos DVD´s de filmes policiais, seus preferidos. Encomendava comida chinesa pelo telefone e bebia cerveja inglesa.
Dormia tarde e acordava na metade da manhã do dia seguinte quando retomava a rotina de contatos e visitas aos clientes e imóveis.
O seu escritório era no próprio apartamento onde ele tinha todas as ferramentas modernas de comunicação e informática.

Ele fora casado e, durante os três anos nos quais esteve com sua mulher, viveu um intenso amor rompido pela súbita morte da companheira quando o avião em que ela viajava sofreu violento acidente no momento da aterrissagem em São Paulo.
Não conseguiu se recuperar do trauma. Buscou ajuda médica, porém não assimilou as observações dos médicos deixando de lado os tratamentos e remédios.
Sentia-se mais seguro sem eles. Desde então passou a ter um comportamento definido por regras pessoais e agia rigidamente de acordo com os novos princípios que adotara.
Experimentava uma autoconfiança cega e não admitia ser criticado, enquanto enxergava somente os defeitos nas pessoas com quem tinha contato. Não media palavras e, muitas vezes, expressava-se intempestivamente sendo arrogante e prevalecido.

Era um profissional eficiente, apesar do comportamento desequilibrado. Pouco atilado, derrubava negócios de colegas e por isso, não tinha muitos amigos.
Gostava de carros antigos com os quais gastava fortunas recuperando-os avidamente.


A REUNIÃO ADIADA

Na metade da tarde o corretor foi avisado pelo celular que a reunião com os empresários havia sido cancelada e transferida para dois dias adiante.
Ele não achou de todo ruim, pois teria tempo para voltar ao sobrado e concluir o levantamento dos dados para o relatório de venda.
Na manhã seguinte, ele se deslocaria até o sobrado. Encontrou o portão da entrada principal fechado com corrente e cadeado. Acionou a campainha insistentemente, sem obter resposta.
Caminhou de um lado para o outro e, ao olhar para a janela da biblioteca, teve a impressão de ter visto alguém espiando por trás da cortina.
Logo pensou que o caseiro estaria dificultando o acesso à casa. Pensou em ligar para o celular do herdeiro, mas desistiu.
Sentindo-se desafiado diante daquela situação e irado com caseiro, pois desconfiava que a dificuldade fosse provocada pelo negro, o corretor procurou ingressar pelo acesso lateral através de um velho portão que se abria para a rua. Ele sabia que os portões velhos tomados pelos cupins não apresentariam resistência aos chutes e empurrões.
Dez minutos depois o corretor já se encontrava dentro do sobrado.
Chamou pelo caseiro e como não obteve resposta subiu a escada com a idéia de chegar à biblioteca. Abria as cortinas para que pudesse tirar as fotos necessárias quando ouviu ser chamado pelo caseiro.
- Guarde a máquina, corretor. Eu já te avisei – disse o negro.
- Tu insistes, negro de merda – disse o corretor.
- Mais respeito, corretor – pediu o negro. – Saia já desta casa. Estou pedindo.

Tomado pelo descontrole emocional o corretor imaginava a figura do negro caseiro aos poucos se transformar. Agora ele enxergava, a sua frente, o padre, diretor do internato onde ele passara boa parte da adolescência como interno num colégio de São Leopoldo.
O padre era um negro exigente e rígido. Punia os internos por causa da cama mal-arrumada ou porque a resposta sobre passagens da bíblia não foram respondidas corretamente.
Castigava-os! Desrespeitava-os! De alguns meninos exigia a rendição imoral aos abusos sexuais. Levava-os para o quarto e subornava-os dispensando-os de prolongados castigos em troca de carinhos obscenos.
Confuso e descontrolado o corretor investiu na direção do negro. Empurrou-o fazendo o velho cair no corredor em frente à porta de acesso à biblioteca. Desferiu-lhe um poderoso chute no rosto e, aos gritos ofendia-o.
Sangrando por conta do profundo corte na testa, o negro indefeso procurava proteger o rosto. O corretor seguia batendo sem dó e com muito ódio. Para ele era no padre em quem batia com os chutes e socos.
O corretor só parou quando ouviu o estampido de arma de fogo. Largou a camisa rasgada pela qual sustentava a cabeça do negro já quase desfalecido e cambaleou.
Deu dois passos para trás.
- Ele me desrespeitou. Achou que poderia me dominar. Ele queria me obrigar a fazer o que eu não queria– disse apontando para o negro.
Com a visão embaraçada viu que o herdeiro portava uma pistola. Sentiu-se zonzo. Instintivamente levou a mão à altura da barriga por causa de uma ardência que lhe provocava arrepios. A camisa ensangüentada denunciava que o ferimento fora grande. Encostou-se na parede. Sangraria até a morte.
O herdeiro deixou a pistola ao lado do corpo desfalecido do corretor tratando de levar o caseiro até o banheiro para lavar o ferimento.


A POLÍCIA

Assim que percebeu a chegada da polícia o herdeiro retornou à cena do crime a fim de recolher a pistola. Não a encontrou. Misteriosamente a arma desaparecera.
Para os agentes policiais o herdeiro contou que foram atacados por um homem, o mesmo que dera o tiro mortal no corretor que, segundo o relato deles, reagira tentando atacar o ladrão. Tudo foi confirmado pelo caseiro que ainda mostrou aos policiais o ferimento na testa.


O TOMBAMENTO

Um mês após o assassinato do corretor o sobrado Vila Formosa foi considerado prédio histórico e, portanto, não poderia ser mais demolido.

domingo, janeiro 06, 2008

AS ARTES E A IGREJA


Lendo sobre a produção artística da humanidade observei que a Igreja já foi a maior patrocinadora dos movimentos artísticos.
Embora ditando as regras e limitando a criatividade de pintores, arquitetos, músicos e interferindo na literatura, vemos que sem o incentivo da Igreja o homem não teria contado toda a história que acumulamos.
A própria Bíblia é considerada uma das maiores obras literárias já produzidas, independente de alguém duvidar da veracidade ou venerabilidade do conteúdo dos livros.
Em determinados períodos da história da humanidade pouco se produziu em termos de arte, justamente porque o homem estava envolvido em guerras, na busca de domínio territorial. Não havia tempo para as artes.
Mais adiante o artista se liberou encontrando seu próprio caminho fazendo arte utilizando o intelecto como agente principal assim como acontece na arte contemporânea.
Desenvolveu técnicas e aprimorou-se até chegar a fazer arte virtual sendo esta, talvez, a forma mais moderna de expressão artística.
A música passou a ser eletrônica; a pintura pode ser feita numa mesa digitalizadora; os livros cabem num disco digital e a arquitetura é “ajeitada” pelos programas de computador.
Pois a Igreja permanece seguindo regras rígidas com o mesmo “desenho” medieval. Nem por isso ela perdeu a capacidade de mobilizar uma multidão de fieis como pudemos observar quando o Papa apareceu durante as festividades de final de ano.
As influências ficam evidentes nas pinturas, nas esculturas, na arquitetura, nas praças públicas, na confecção de instrumentos musicais e nos cantos corais.
Assim, o papel da Igreja acabou, como patrocinadora das artes, contando ou fazendo um lado da história da humanidade através dos ícones que permanecem e permanecerão sendo utilizados por muito tempo.
Obra: "Creation of Adam" - 1.510 - Capela Sistina - Cidade do Vaticano - Michelangelo.


terça-feira, janeiro 01, 2008

PARABÉNS A MIM MESMO

Cheguei aos 54 neste 01-01-08!
Como eu costumo dizer que tenho 64, todos me acharam muito bem para a idade.
Aos amigos, obrigado pelos e-mail.