terça-feira, março 30, 2010

A CAPELA

A área onde Abzuk instalara o Laboratório de Pesquisas fazia parte de um riquíssimo sitio arqueológico. 
Na região foram encontrados vestígios da passagem de uma civilização com hábitos medievais. Durante as obras do pavilhão dos fornos crematórios existentes, no lado oeste do grande terreno, os operários depararam com ruínas do que teria sido uma igreja ou uma capela. 
Abzuk mandou que buscassem um dos melhores arqueólogos para desvendar o mistério. Depois de dois anos de intensa pesquisa o arqueólogo australiano Benn Ashes e sua equipe chegou à conclusão de que não se tratava de uma civilização medieval, mas de um povo que viveu naquela região há, aproximadamente, cinco séculos, e que cultivara hábitos e costumes da Idade Média. 
A área foi isolada e Benn Ashes descobriu que a língua falada por aquela gente era um dialeto grego.
Castiçais, pratarias, cálices, sacrários, tiaras, anéis, báculos cravejados e apetrechos utilizados no preparo de alimentos deixavam claras as relações com aquela cultura milenar. Porém, uma peça ricamente decorada com pedras preciosas, toda em ouro, foi entregue a Abzuk. Tratava-se de um cibório. 
Após o mapeamento do prédio soube-se que era constituído de um grande salão central onde, no piso, tinha estampado o desenho de uma enorme estrela com sete pontas; o chão era de pedras de basalto cinza e preto com formato regular e a estrela fora executada com pedras de mármore branco, talvez da região de Carrara. Na extremidade de cada ponta tinha um pequeno círculo colorido. Cada um deles era de uma cor que iam do azul, ouro, rosa, branco, verde, vermelho-rubi e violeta. O teto teria sido de vidro colorido e com desenhos com temas medievais, compostos de peças irregulares que formariam um desenho e fixados com encaixes de chumbo. A forma da abóbada abatida indicava que ali fora um templo de contemplação e rezas. O salão era quadrado. Numa das paredes havia uma porta; nas demais os pesquisadores encontraram duas portas em cada uma das três paredes restantes. Observando com cuidado Benn Ashes constatou que cada ponta da estrela de mármore apontava para uma das portas. As portas davam acesso a salões menores que seriam, talvez, dependências de serviços, de leitura e reuniões, refeições e repouso. 
As paredes foram pintadas com as cores correspondentes às encontradas nas sete pontas da estrela. A tinta estava em péssimo estado. A porta isolada, a única dupla e alta, ligava a um salão também de forma quadrada onde, no centro, existia uma mesa de mármore branco. Não havia janelas; somente furos nas paredes que Benn Ashes e sua equipe constataram servirem para ventilação. O local fora utilizado como uma câmara mortuária. 
Mais uma vez, em cada uma das paredes havia uma porta. Ao ingressar nas respectivas dependências, o arqueólogo encontrou ossadas amontoadas de seres humanos adultos e crianças. 
Nas paredes, as inscrições feitas com algum objeto de ponta, talvez pedra de basalto, exibiam desenhos de soldados atacando pessoas com espadas e montando cavalos. Outros desenhos foram vinculados à cultura fenícia do século VII. Por todos os cantos apareciam referências ao alfabeto de 23 letras. 
Abzuk providenciou a recuperação e limpeza do local. O prédio passou a ser um tipo de prisão. Quando um de seus adversários ou inimigos precisava de um “corretivo”, como ele dizia, era encaminhado à Capela. Ali poderiam permanecer pelo tempo necessário até que Abzuk definisse se deveriam ser mortos. 
A mesa de mármore servia para que os prisioneiros inimigos enfrentassem sessões de torturas. Inicialmente ficavam deitados, completamente imobilizados, por uma semana, amarrados com correntes presas a ganchos encravados no piso. Sobre o rosto, afastado por dois metros, fora instalado um refletor potente, cujo foco era direcionado a face do preso até cegá-lo. Sofriam choques elétricos e, se fossem mulheres, eram estupradas durante o período por vários homens. Dessas orgias, Abzuk era o primeiro a abusar. A única regra era que a mulher fosse jovem. Não fazia diferença se de cor branca ou negra. 
Primeiro ela era trancada em uma das celas, solitária e nua o tempo todo. No interior tinha uma cama e um banheiro. O número de dias de abusos se estenderia pelo tempo que Abzuk achasse necessário. Mais adiante a jovem era deitada na mesa de mármore para que os outros procedessem os estupros; ela teria o mesmo destino dos outros presos: a morte.

Trecho extraído do conto "OS 7 CIBÓRIOS" - Capítulo: A Capela
Autor: George Arrienti - Ano: 2008

quarta-feira, março 17, 2010

A VELHICE DO VICTOR

O corpo curvado pelo tempo parecia anunciar que já seria a hora de parar.
A história de Victor, um descendente de colonos alemães, conta que ele foi professor de Educação Física.
Talvez tenha 85 anos. Logo lembrarei para contar.
Estive ontem conversando com ele como faço sempre.

Nem toda a história de Victor é conhecida. Alguns capítulos se perderam.
Coisas que aconteceram  há cinco ou seis dias, há trinta dias, ele não consegue lembrar.
Mas ontem ele lembrou do dia em que venceu a competição de atletismo, quando tinha 22 anos, no clube da capital. Victor defendia as cores do clube de sua cidade. O uniforme era vermelho e o brasão bordado na camiseta era branco e amarelo.

Ele fica ali, sentado, sozinho e olhando para o chão. Ontem,  a mão tremia segurando a bengala de madeira, herança de seu avô. Tremeria mais se não tomasse o remédio indicado pelo médico.
Eu sempre tomo  cuidado de lembrá-lo.

Lúcido!

Conversamos sempre sobre muitas coisas. Lembramos daquilo que conseguimos recuperar com a ajuda da nossa memória e, pinçando um detalhe aqui e ali, temos boas histórias para contar. Quando não nos lembramos das coisas, nos resta rir.

Ontem Victor reclamou da dor no braço, o mesmo que ele já havia quebrado naquele jogo de basquete, há 60 anos, quando disputava o principal torneio da cidade.
Porém, dessa vez a causa da dor era outra: dois guris  invadiram sua casa num início de noite e, enquanto ele preparava o café, os vagabundos o derrubaram, roubaram dinheiro e o abandonaram com o braço quebrado e muita dor.
Victor mora sozinho. “Já estou acostumado com a solidão, conta ele. É assim há 30 anos.”
Mais uma semana e ele poderá voltar para casa. O lar para idosos em que ele está hospedado é agradável, mas nada como a casa da gente, afirmava Victor e eu concordava plenamente.

Bem. Na verdade, eu, o contador desta história, sou o próprio Victor. Tenho 89 anos e não 85 e adoro conversar com o Victor, aquele velhinho que, por mais que queira, não tem mais todas as forças físicas.
Eu sou o Victor – o Lúcido – apelido que ganhei do Victor. Sou aquele que pensa e que ama a vida. Aliás, pensar não dói nada. Acreditem!
Assim, eu o Victor aproveitamos nosso precioso tempo para contar histórias um para o outro e fazer planos. Muitos planos.

quarta-feira, março 10, 2010

SOBRE, EU NÃO ESCREVO.

Não gosto das crônicas que eu escrevo e que falam de mim e das minhas histórias; não gosto de escrever sobre  meus passados e nem sobre meus futuros;  não gosto de escrever sobre como escrever, sobre como dizer, sobre fórmulas de dizer e de escrever, e de estilos, e de como eu sou, e de como eu era, e de como eu fui ou de como serei.
Não gosto de quem escreve sobre como ele mesmo escreve.
Sobre, eu não escrevo

sábado, março 06, 2010

CROONER BY DIJEYLSON

Mania é a forma adiantada do hábito, ou ainda, é o estágio final de uma situação que começou com um simples hábito e chegou ao extremo quase doentio de uma mania. 
Mas, Dijeylson não via desta forma. 
O nome o incomodava, porém não tinha como deixar de se apresentar às pessoas, segundo ele justificava, falando essa aberração de nome como ele fazia questão de qualificar, e explicava culpando o pai pela infeliz ideia. 
Ele não era um cara velho, se é que as manias e os hábitos são coisas exclusivas dos velhos. Tinha 50 . 
Das manias que o tiravam do sério, duas eram as suas favoritas: ficar preso em engarrafamento e vocalista de banda cantado música com letra em inglês sem saber falar razoavelmente bem. 
Numa ocasião, Dijeylson, que era um notívago e apreciador de bons estilos, decidiu que iria, afinal, ao pub escolhido pelos parceiros de blues e jazz. 
O bar ficava na zona sul da cidade. 
Depois de encerrar suas atividades no escritório, arrumar a mesa de trabalho, esvaziar a lixeira - inclusive a do lavabo da recepção -, fechar janelas e portas e baforar o ambiente com o cheiro de ervas da natureza, ele seguiu para casa; a pé, evidentemente, pois, a fim de evitar o transtorno dos engarrafamentos da hora do pico, escolhera morar ao lado do prédio onde tinha o seu escritório. 
O apartamento ficava no sexto andar, longe dos ruídos do trânsito da avenida. Era pequeno e todas as janelas abriam ao  leste para melhor aproveitar a insolação. Ele não usava o elevador; ia de escada para exercitar os músculos e, na verdade, para evitar encontrar-se com aquela vizinha do sétimo andar. A mulher tinha dois filhos; a menor, criança de 6 meses, chorava sem parar e sem ter a devida atenção daquela “mocreia”, como ele alcunhara a vizinha do andar de cima. 
O horário previsto para a saída de casa era cronometrado. Como depois das oito da noite o trânsito tinha menor número de veículos, e como o trajeto até o pub deveria necessariamente passar pela rodovia que margeava a cidade, Dijeylson, pontualmente, acessou a estrada as oito e sete daquela quinta-feira. O plano era chegar em quinze minutos. 
Deu merda! 
Por causa de obras de pintura da pista, um enorme engarrafamento estava bem ali, a sua frente. Os carros passavam somente por uma das pistas que havia sido liberada. O sangue ferveu, o ânimo desceu e restava esperar a vez. 
Ele ficou explicando para si mesmo, em voz alta, como aquelas obras deveriam ser executas; definiu o melhor horário e falou mal de todos os ancestrais dos engenheiros, diretores e o raio que o-parta daquela empresa incompetente, não se esquecendo de fazer as piores avaliações aos políticos corruptos que liberaram as verbas mais as propinas que, certamente, estavam embutidas naqueles serviços de pintura. 
Passados 30 minutos naquele engarrafamento, Dijeylson conseguiu estacionar o carro próximo ao pub. Conversou com o segurança pedindo atenção especial, prometeu gorjeta e logo ele estava no palco.
Ele era o vocalista da banda que naquela noite faria o show.
O espetáculo transcorreu normalmente até o intervalo do primeiro bloco. 
Foi quando um dos assistentes se aproximou, identificou-se como Charles Fender, de Chicago, disse, falando em inglês, que morava no Brasil havia dois meses, que gostava de blues, que era professor de inglês e entregou um cartão de visitas, no qual  dizia ser ele professor especializado em aulas de conversação e dicção. 
“Nada pessoal”, justificou Charles, mas gostaria de colaborar, inclusive, sugerindo um nome artístico, pois “Dijeylson” soava muito mal.

quarta-feira, março 03, 2010

SHOW NO ESPAÇO CULTURAL VILLA D'ASSISI






A JAZZUEIRA - Jazz e Blues, fará show de estréia no Espaço Cultural e Restaurante VILLA D'ASSISI, em São Leopoldo no dia 4/03, às 21 h.

No repertório clássicos do jazz e do blues, bem como canções autorais.
Ouça algumas delas no: http://palcomp3.com.br/jazzueira
O release do grupo você poderá conhecer no texto publicado anteriormente neste blog sob o título: "NASCE A JAZZUEIRA".
Confira.