domingo, janeiro 31, 2010

EU LÁ

Eu lá, em pé, procurava abrir o zíper. No mictório, cascas de limão exalavam o odor que se misturava ao cheiro da urina respingada. 
Ouvi o barulho vindo da descarga de um dos vasos sanitários. Um homem abriu a porta. Não me olhou, não lavou as mãos e deixou o banheiro. 
Eu permaneceria ali mais um tempo tentado entender aquela situação e abrir o zíper. 
A porta daquele box de onde há pouco o homem saíra abria-se lentamente. Eu podia ver com o canto dos olhos. De lá saiu um garoto. Estava assustado. Espiava para os lados. 
Eu não podia virar meu rosto para fitá-lo. Não conseguia. Eu estava procurando me entender. 
Segui olhando para a parede em frente. O garoto balbuciou alguma coisa que eu não consegui entender. Veio em minha direção. Pediu ajuda. Disse que o homem o violentara e queria que eu visse as marcas roxas nos braços dele e que eu não contasse para ninguém. Ele estava envergonhado e se culpava por tudo. Não queria saber de polícia. 
Eu então entendi o que se passara e encontrei a resposta para a minha dúvida. 
Fiquei de frente para o garoto. Ele me olhou e veio ao meu encontro. Abracei-o. 
Lá fora, o homem já havia sido detido e, algemado, fora colocado dentro do camburão da polícia. 
Como uma policial competente eu desvendara aquele caso de estupros que vinham acontecendo há dois meses. 
Permaneci abraçando meu filho ali mesmo até que um policial chegou para nos acompanhar.

sexta-feira, janeiro 22, 2010

CONVERSA

Estás triste!
Saudade? Doença? Dinheiro?
A vida? A morte? A dor?
Se amor dá vida, vivo estás!
Basta.

domingo, janeiro 17, 2010

HUMANIDADE ANSIOSA

A evolução da humanidade se faz por conta da ansiedade. Tenho certeza disso.

Por isso morremos enfartados. Não sabemos dimensionar nossas necessidades mais primárias.
Basta ver como nos comportamos.

Se vamos a uma recepção nos preocupamos com os cartões de visita e os colocamos estrategicamente no bolso do paletó para que tão logo sejamos apresentados ao outro, o aperto de mãos seja seguido de um cartonasso recíproco. Tudo muito mecânico e contábil.
Rimos e demonstramos segurança e afabilidade. Sorrimos e nos fazemos de velho amigo.
Logo partimos à caça e procuramos outro possível “negócio”.
Somos abordados e abordamos porque ninguém deve perder tempo; ninguém deve ser notado encostado num canto conversando sobre qualquer coisa que não seja “negócio”.
Assim é o padrão de comportamento se quisermos ser reconhecido e aceito na tribo.

Se vamos ao teatro queremos o melhor lugar e corremos a fim de chegar antes à bilheteria.

Se estivermos no trânsito temos que ultrapassar, pois estaremos em vantagem. Afinal chegaremos dez minutos antes.

Vamos ao restaurante e lutamos por aquela mesa na janela.

Nosso carro deve ser do ano. É preciso, porque o cliente fará sua avaliação de zero a dez ao observar o carro, a roupa, o corte de cabelo, o relógio e modelo de nosso telefone celular.

Nós com mais de 50 temos a impertinência de nos acharmos um pouco acima das coisas, pois os tropeços e vitórias nos avalizam. Sempre dizemos isso. Nossos cabelos brancos impõem certo respeito. Mas nos deixam incomodados porque parecemos velhos e isso poderá atrapalhar em algum momento.

Na verdade o comportamento humano, ao longo da história, demonstra uma enorme ansiedade que é provocada por regras impostas por padrões de comportamento da tribo em que vivemos e pelas oportunidades que vislumbramos.

Não conseguimos nos enxergar igual ao outro e nos exigimos sermos superior, melhor e mais esperto.

Agora me dou conta.  Escrevi este texto porque me sentia ansioso e agora ficarei mais ansioso ainda aguardando por algum comentário no meu blog.

sábado, janeiro 16, 2010

MINHA MÃE


Perder minha mãe foi cruel!
O relógio marcava 20:38 de segunda, 22 de maio de 2009.
Ninguém me avisou. Era minha mãe! Eu senti!


Ela assobiava o dia inteiro desafiando o sabiá da pitangueira do quintal dos fundos.
Um dia ela me fez pegar o violão e tocar boleros, tangos e sambas que ela cantava com seu jeito emotivo.
Minha mãe me ensinou a respeitar o mar, os animais, a natureza, as pessoas...
Ela era só amor.

domingo, janeiro 10, 2010

INCLUSÃO SOCIAL

A expressão inclusão social, tão utilizada nos dias de hoje, deveria ser tratada com mais cuidado, pois corremos o risco de vê-la vulgarizada de tanto ser repetida. Tirante a verdadeira função de incluir ou dar oportunidade às pessoas excluídas dos processos sociais, como educação e saúde, por exemplo, devemos analisar também por outros ângulos, visto que, inserir socialmente é muito mais abrangente do que podemos imaginar.


NA POLÍTICA 
Poderíamos começar dizendo que a classe política brasileira deveria trabalhar pela própria inserção social, pois trabalham em causa própria. Basta ter acompanhado os nauseabundos atos corporativos ocorridos durante o ano legislativo e executivo, quando os maus representantes do povo saíram em defesa daqueles que não respeitam o cidadão brasileiro. A ética parece não fazer parte da formação daqueles políticos inescrupulosos.


NO FUTEBOL 
Há muito que o futebol deixou de ser o setor que mais trabalha na direção de trazer das camadas excluídas da fatia pobre da sociedade brasileira jovens miseráveis dando-lhes chances de se desenvolverem como seres humanos. Dirigentes imorais aproveitam-se da ingenuidade de atletas e torcedores. O que menos importa é a inclusão social. Empresários ávidos ganham muito dinheiro explorando famílias de meninos que mal dominam o próprio idioma, jogando-os como objetos nos clubes da Europa, sem se preocuparem com as consequências provocadas nos garotos pelo choque cultural. A imprensa esportiva por sua vez, arrogante e muito bem treinada para lucrar em cima do futebol, dedica horas opinando desde o esquema tático até o modo como os clubes deveriam administrar seus falidos cofres e, sem maiores preocupações, arriscam palpites o tempo todo.



NA RELIGIÃO 
Um grande negócio que gera lucros em cima da boa fé de pessoas incluídas e excluídas, principalmente dos pobres, carentes de educação e saúde. As igrejas “vendem” bilhetes sorteados para a inclusão, mas no reino dos céus. Normalmente é uma viagem sem volta, pois as pessoas se tornam radicais.


NA MÚSICA 
Ainda é a forma mais direta de inserção social. É popular por definição porque vem do povo e é feita para o povo. Por isso mesmo reflete o nível cultural. De baixa qualidade a música é disputada pelo mercado fonográfico porque é produto que vende em grande quantidade. A música ainda é o único canal de inclusão social apesar de estar alicerçada nos modismos criados pelos marqueteiros que trabalham para a indústria de discos. Os inseridos socialmente de hoje poderão não estar mais incluídos amanhã!


NA MÍDIA 
Formadora de opinião deveria fomentar a integração da população brasileira. Porém, a televisão como sendo a mais importante ferramenta da mídia, nos empurra padrões de comportamento, desprezando culturas muito mais ricas e sérias. Quando abordam temas relativos à inclusão social vem, novamente, o futebol como sendo a única porta de acesso a inserção social. Explora o negro como exemplo único de excluídos e tratam o índio e os brancos miseráveis com menos interesse.


NOS MAIS RICOS 
Países ricos e aqueles que são donos de enormes fortunas deveriam também inserir-se socialmente, criando e participando mais ativamente de programas de inclusão social, distribuindo um pouco daquilo que possuem a fim de proporcionar melhor qualidade de vida à parte da população miserável.


CLIENTELISMO 
Não haverá inserção social através de políticas clientelistas. Evidentemente que é salutar ver mais pessoas se alimentando. Melhor seria vê-las se alimentando e ocupando novos postos de trabalho e não sendo objeto de manobras ardilosas e populistas na busca de votos para as próximas eleições. Com trabalho seriam independentes. Mas será que independência interessa?