domingo, abril 04, 2010
FAZIA FRIO
Noite de Domingo. Eu caminhava pelo Centro da cidade. Os sacos de
lixo, em frente ao prédio velho, estavam revirados. Restos de comida
apodrecida, caixas de papelão e jornais, ali, encharcados pela fina chuva que
lavara as ruas e calçadas esburacadas por onde circulavam alguns homens e
mulheres. Fazia frio e por isso fechei o primeiro botão da japona, perto do
peito. Tossi, escarrei. Doía por dentro da carne. Pensei que eu deveria
procurar um médico. Tive que tossir. Tinha febre. Um café! Entrei num boteco.
Embriagados se esfregavam nas prostitutas encostadas em mesas de plástico
vermelho; ouviam pagode; bebiam cerveja. O cheiro de álcool, cigarro e fritura
me enjoaram; quase vomitei. Quando levantei os olhos, depois de ter me
contorcido de ardência, vi um negro e uma vagabunda se beijando. Estavam atrás
do balcão. Nada discretos e bêbados. Esqueci do café; comprei um maço de
cigarros. Eu não fumava há um mês. Um vira-lata me fez companhia. Uma criança tentava dormir na soleira da loja tendo um papelão como cama; o saco plástico, como
cobertor. Ela chorava, tinha fome. Voltei ao bar e com pastel e leite alimentei
a pequena. Pranteei com ela. Diabos! Segui em frente... A chuva apertou e
molhou ainda mais o asfalto que refletia as luzes da noite fria. Parei na esquina.
O vento soprava mais frio que há pouco. Um táxi estacionou e dele desceu um
travesti. Sorriu para mim. Malicioso! Atravessou a avenida. Ele cambaleava. O
cigarro queimou no canto da minha boca. Puxei a fumaça sem tirá-lo
dos lábios. Lábios... Lábios molhados. Traiu-me. Deitou-se com outra, a sua
amiga. Felonia? Depois deu pro Beto; e pro Piti, deu no chuveiro. Vagabunda!
Sei de tudo! Contaram-me! Eu sei! Eu corno! “Eles passarão... Eu, passarinho”.
Sob a marquise me protegi porque a chuva apertou. Elas, as pessoas, cruzavam
por mim sem me notar, ou se faziam. De certo tinham medo porque, talvez, eu
viesse a agredi-las, assaltá-las, estuprá-las. Fazia frio! Muito frio!
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